quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Disciplina Eclesiástica

"E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as."  (Efésios 5.11) 

Há dois tipos básicos de disciplina na vida da igreja:

A) Disciplina formativa (Aspecto Preventivo)

Advertência por meio de ensino (2 Tm 2.24-26; Tt 1.9); Admoestação sobre a seriedade do pecado (1 Ts 5.14; Tt 3.10-11).

B) Disciplina corretiva (Aspecto Repressivo)

O pecado já encontra-se consumado. O arrependimento não foi evidenciado pela via prescrita em Mateus 18, então a disciplina eclesiástica corretiva é aplicável ao pecador. A disciplina pressupõe uma preocupação ativa uns com os outros no Corpo de Cristo, pois o alvo é sempre corrigir as transgressões da lei de Deus entre o povo de Deus. Paulo percebeu a ausência total, entre os coríntios, de uma sensibilidade adequada diante de um pecado específico, que realmente provê aos inimigos do cristianismo um motivo ainda mais forte para amaldiçoar e ridicularizar as suas afirmações.

No capítulo 5 da carta, Paulo aborda o procedimento disciplinar em três contextos: a autoridade total de Jesus Cristo como Senhor (em nome do Senhor Jesus), a presença corporativa de toda a comunidade cristã em Corinto (apoiada pela sua própria presença em espírito, v. 3) e o controle soberano do Senhor sobre tudo o que Satanás tem permissão para fazer, mesmo a um cristão rebelde. Não se trata de o cristão, mesmo quando culpado do tipo de pecado grosseiro aqui descrito, perder a esperança na salvação eterna e distanciar-se do estado da graça. Pelo contrário, o pior dano que Satanás pode causar (a destruição da carne, v. 5) está totalmente sob a autoridade de Jesus Cristo.

OBS.: Convém destacar que esse membro excluído perderia toda a utilidade potencial de sua vida nesta terra e, portanto, toda a esperança de ser recompensado por sua mordomia fiel dos dons de Deus, quando chegasse à plenitude da vida eterna.

O fracasso da igreja atual ao exercer a disciplina correta na igreja geralmente brota de uma convicção distorcida, e talvez covarde, de que tais assuntos são atribuições da liderança, e não da congregação como um todo. Paulo dirigiu suas palavras de repreensão severa (não chegastes a lamentar) a toda a igreja, não apenas à liderança.


Propósitos da disciplina na igreja:

1) Para o bem da pessoa disciplinada
2) Para o bem de outros cristãos, quando percebem o perigo do pecado
3) Para a saúde da igreja como um todo
4) Para o testemunho coletivo da igreja (devemos marcar pela diferença)
5) Para a glória de Deus, quando refletimos a Sua santidade

Observações importantes:

- O resultado almejado da disciplina na igreja é sempre o arrependimento e a restauração do ofensor.

- A conivência ativa com o pecado (fermento) sempre vai acarretar maiores prejuízos para a igreja. Todo o culto e toda a vida da comunidade cristã se transformam em uma farsa, cheia de insinceridade e hipocrisia.

- O mundo anseia por ver uma igreja que leva o pecado a sério, que desfruta plenamente o perdão, e que, em seus momentos de reunião, mistura celebração cheia de alegria com um respeitoso senso da presença e da autoridade de Deus.

- O arrependimento genuíno consiste em mais do que tristeza e lágrimas (2 Co 7.9-11). O arrependimento verdadeiro torna-se evidente quando um transgressor está disposto não somente a abandonar seu pecado, mas também a confessá-lo a todos que são por ele afetados.

- A disciplina é designada para ajudar o cristão individual e a congregação a crescerem em piedade, e a fazer brilhar a luz da verdade de Deus sobre o erro e o pecado.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

A ressurreição e a vida

No Evangelho de João, está registrado que Jesus proferiu as seguintes palavras: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá; e todo o que vive e crê em mim não morrerá, eternamente.”  (Jo. 11:25-26)

O contexto desta passagem é bem conhecido. Lázaro, o amigo de Jesus, tinha morrido. Seu corpo estava em uma gruta que lhe servia de tumba. A decomposição do corpo tinha começado, pois o texto bíblico nos informa que o corpo havia 4 dias que fora sepultado e já fedia. Mas, o Senhor Jesus, ele mesmo senhor da vida e da morte, se aproximou da tumba e mandou tirar a pedra que fechava a entrada. 

Jesus é o Deus encarnado. Nele reside o pleno poder para trazer a vida alguém que já está morto. Quando Ele diz ser "a ressurreição e a vida", ele faz referência a este poder que modela todo o nosso mundo. O poder da ressurreição foi experimentado pelo próprio Cristo, após 3 dias de sua morte na cruz do Calvário. Muitas pessoas viram a Jesus após a sua ressurreição, e alguns discípulos o tocaram. Não era um espírito (como muitos afirmam), era o corpo humano do Senhor em todo a sua majestade e glória.

O mesmo poder que ressuscitou Lázaro e que operou na ressurreição do Senhor Jesus, será manifestado na vida daqueles que morreram em Cristo. Aqueles que tomaram o caminho da cruz, e morreram para o próprio EU, para suas vontades pecaminosas e se renderam ao senhorio de Cristo, certamente ressuscitaram para uma vida eterna. A graça que alcança o pecador é a mesma graça que triunfa sobre a morte. A fé em Jesus nos tira de um estado de morte espiritual e nos traz vida espiritual verdadeira. E o corpo que jaz num túmulo há de ressurgir para habitar eternamente com o Senhor nos céus. 

Este ensino é um dos pilares da fé cristã. Paulo nos adverte: “se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã, a vossa fé” (1 Co. 15:14). E também: “Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes de todos os homens.” (1 Co. 15:19).

Se você não é cristão e se ainda não ouviu o chamado da graça de Deus, eu o advirto que um dia você também será ressuscitado, não para vida eterna, mas para vergonha e horror eterno. E a você que é cristão, eu gostaria de exortá-lo a viver de modo digno de alguém que foi ressuscitado para uma vida nova, e que habitará eternamente com Cristo.


sábado, 13 de dezembro de 2014

PAULO: UM PAI ESPIRITUAL

O apóstolo Paulo apresenta-se como pai espiritual dos fieis em Corinto. Esta ilustração fala de uma relação estreita, familiar e próxima. Mas seus filhos espirituais se rebelaram contra sua autoridade, dando início a um longo e doloroso processo de conflito. Mas é importante perceber que Paulo não desistiu desta igreja rebelde e complicada. Com amor e firmeza ele soube dosar a doutrina correta para admoestar os coríntios. Admoestar significa literalmente “colocar alguma coisa dentro da mente”, com o objetivo de instruir e corrigir. Alcançar a mente com a verdade de Deus, que transforma o homem de dentro para fora é objetivo de todo fiel ministro do Senhor.

Paulo afirma que não era um mero preceptor – “paidagogos” (o escravo que tinha a responsabilidade de cuidar de uma criança e conduzi-la para a escola); seu papel tinha sido o de gerar muitos filhos espirituais por meio do Evangelho de Cristo. Vejamos como o apóstolo assumiu este papel de pai espiritual das pessoas que estavam sob a sua responsabilidade:

· O pai como exemplo para os filhos: ensinar não apenas por aquilo que diz, mas sobretudo por aquilo que faz. Paulo imitava a Cristo, e servia como exemplo para os seus filhos na fé. O que os coríntios deviam imitar em Paulo? A paixão e o zelo por um ministério centrado na pregação da cruz de Cristo, que não deixava espaço para orgulho ou qualquer presunção humana. Outra aspecto do ministério de Paulo digno de imitação era o fato de que ele não queria um fã-clube em seu nome. O que Paulo queria não era a fidelidade dos coríntios ao seu nome, mas a obediência ao seu exemplo como cristão. Outros textos que mostram este anseio de Paulo: “Irmãos, sede imitadores meus e observai os que andam segundo o modelo que tendes em nós” (Fp 3:17). “Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo” (1 Cor. 11:1).

Você tem sido um modelo para outros irmãos? Você poderia ser considerado um referencial de retidão para os que lhe rodeiam?

· O pai como disciplinador dos filhos: O pai não apenas promete disciplina, mas a aplica em justa medida. Há um momento em que a única forma de alcançar o coração do filho é o expediente da disciplina. Reter a vara do filho é pecar contra ele. Um pai que ama não pode ser indulgente com os filhos que insistem num caminho de rebeldia. Crianças mimadas são um grave problema na família; da mesma forma crentes mimados são a tragédia da igreja.

· O pai como canal de afeto e carinho para os filhos: a ternura do pai deve estar presente no trato com os filhos. Há sentimentos de proximidade, intimidade e amabilidade dentro da igreja que precisam ser cultivados pela liderança e por todos os cristãos. Vejamos outros textos bíblicos que mostram este caráter cuidadosos e atencioso de Paulo: “meus filhos, por quem, de novo, sofro as dores de parto, até ser Cristo formado em vós” (Gl. 4:19) “Embora pudéssemos, como enviados de Cristo, exigir de vós a nossa manutenção, todavia, nos tornamos carinhosos entre vós, qual ama que acaricia os próprios filhos.” (1 Ts. 2:7). O servo de Deus precisa estar atento às necessidades daqueles que estão sob a sua liderança, exercendo sempre com fidelidade o papel de cuidador.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Propaganda enganosa

Texto: Mateus 6:1-8; 16-17

A propaganda ou publicidade enganosa é a que contém informação falsa capaz de convencer o consumidor a adquirir um produto ou serviço diferente do que pretendia - ou esperava - na hora da compra. De acordo com o Art. 37, do CDC, “considera-se enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, que seja capaz de induzir o consumidor a erro a respeito das características, qualidade, quantidade e propriedades de produtos e serviços.” Recentemente, a filial de uma grande marca esportiva na Austrália foi multada em R$ 700 mil por propaganda enganosa e condenada a pagar US$ 25 milhões em reembolso para os compradores de seus modelos EasyTone e RunTone. Segundo a campanha de marketing, o tênis “EasyTone” ajudavam a melhorar o tônus muscular das pernas com o simples ato de caminhar. A empresa anunciou falsamente que o tênis proporcionava 28% a mais de força e tonificação nos músculos e 11% mais força nos ligamentos e panturrilhas do que os tênis comuns. O problema é que este fortalecimento dos músculos não foi comprovado cientificamente pela fabricante do tênis.

E por falar em propaganda enganosa (que não fica somente no campo do marketing de grandes empresas), o presente texto nos apresenta Jesus expondo a raiz do problema no coração do homem. Ao longo do ministério de Cristo, os fariseus e escribas foram alvos de duras críticas porque por fora se mostravam muito piedosos, mas não passavam de uma fraude completa (por fora bela viola, por dentro pão bolorento). Eles alardeavam boas obras e atitudes caridosas, mas não estavam dispostos a romper com o padrão errado de interpretação das Escrituras e nem com o pensamento ímpio. No contexto do Sermão do Monte, Jesus passa a abordar três instâncias da vida muito comuns para o judeu (dar esmolas, orar e jejuar). Nestas atividades, a propaganda enganosa estava muito presente. As três abordagens seguem um padrão idêntico. Em imagens pitorescas e irônicas, Jesus pinta um quadro da falsa propaganda promovida pelos pretensos religiosos da sua época.

Mas não devemos ficar confortáveis nesta questão, pois na vida cristã autêntica não há espaço para a propaganda enganosa. Somos convocados a nos despir de qualquer dolo ou malícia, e nos revestir da verdade. Para isso, temos ao nosso dispor o auxílio do Santo Espírito e a orientação da Palavra da Verdade. Nunca foi projeto de Deus que aparentemente sejamos piedosos, precisamos verdadeiramente ser piedosos. A verdadeira piedade deve vir do interior. O homem regenerado é transformado radicalmente de dentro para fora. Aqueles que promovem propagandas enganosas não desejam esta transformação radical, preferem criar ilusões para si e para os outros.

PROPOSIÇÃO:

“Promover propaganda enganosa de piedade é inadmissível para os discípulos de Cristo”

Por três MOTIVOS:

Vamos acompanhar o argumento de Jesus para combater este terrível mal da propaganda enganosa no reino de Deus. Vamos abordar três motivos que estão presentes no seu argumento para que possamos ser despertados para um viver autêntico e sem máscaras. A pergunta que nos cabe ao longo deste sermão: será se somos promotores de propaganda enganosa? Será que as nossas vidas refletem o cristianismo genuíno e reto? Como discípulos de Cristo Jesus, não nos é cabível promover propaganda enganosa de piedade, e se o fazemos é por conta de nossa própria rebeldia e orgulho, que precisa ser urgentemente tratado à luz das Escrituras.


1) Porque Cristo enfatizou o caráter discreto da verdadeira piedade
"não toques trombeta... nas sinagogas e nas ruas" (vs. 2)
"ignore a tua mão esquerda o que faz a tua mão direita" (vs. 3)
“entra no teu quarto e, fechada a porta” (vs. 6)
“não vos mostreis contristados” (vs. 16); “com o fim de não parecer aos homens” (vs. 18)

A nossa natureza egoísta quer estar no centro dos holofotes. Por conta da queda preferimos endeusar a nossa imagem pessoal, e isto é feito de várias maneiras. Uma delas é ostentar atos piedosos em demonstrações públicas. Em geral, os fariseus tinham o costume de deixar bem evidente os atos praticados. “Tocar trombeta” é uma hipérbole que Cristo usa para denunciar e ironizar a forma calculada que os fariseus adotavam para que as pessoas notassem suas virtudes. A ilustração da mão esquerda que desconhece o que faz a direita reforça o ensino sobre a importância do sigilo. “Entrar para o quarto e fechar a porta” é a evidência de que o nosso relacionamento com Deus é nutrido sem a necessidade dos holofotes e dos aplausos humanos. Os fariseus desfiguravam o rosto quando jejuavam para apresentar uma expressão abatida, a fim de despertar atenção, suscitar compaixão e receber elogios. Em todos estes exemplos, fica evidente que o problema da falta de discrição estava na motivação incorreta, que tornava os fariseus devotos de si mesmos. Querendo ser admirados, eles buscavam pontos para si mesmos através da estratégia do espetáculo (Mateus 23:5-7). O ego dos fariseus desejava sempre estar inflado.

Ilustração: a discrição foi a marca na vida do nosso Mestre. Cristo não buscou chamar atenção para si em seu ministério, sempre houve discrição nos atos miraculosos que Ele realizava e não procurava ocasiões para exibicionismo. “Não clamará, nem gritará, nem fará ouvir a sua voz na praça.” (Is. 42:2). Ele buscou silenciar o entusiasmo gerado por suas curas (Mt. 9:30; Mc. 7:36).

Mas como conciliar o ensino de Jesus sobre a discrição dos discípulos com o ensino sobre ser luz que brilha entre os homens? À primeira vista, estas palavras parecem contradizer o seu mandamento anterior: “Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras” (Mt. 5:16). Não há contradição nenhuma, pois quando fazemos brilhar a nossa luz o objetivo é sempre que os homens glorifiquem ao nosso Pai e não a nós mesmos. Jesus não aprova nos seus discípulos nem a covardia (deixar a luz oculta) e nem a vaidade (brilhar para chamar atenção para si). Bruce resumiu bem: “quando tentados a esconder, devemos evidenciar a nossa fé e quando tentados a mostrar, devemos ser discretos.”

Na literatura de sabedoria discrição está associada com prudência e discernimento. A discrição também está diretamente atrelada com a humildade, e deve ser uma característica permanente na vida de todo cristão. Chamar a atenção em benefício próprio é uma tentação sempre presente, é muito tentador “tocar a nossa própria trombeta” para sermos percebidos e aclamados. Jesus nos convoca a uma vida piedosa que seja marcada pela discrição, sem nenhuma ostentação dos feitos realizados em prol do reino de Deus. Não somos chamados a alardear os nossos atos de misericórdia, quando feitos em favor de pessoas (esmolas, ajuda) ou em favor de nossa própria alma (oração, jejum). Os ministérios na igreja devem ser exercidos com discrição e sem estrelismo.

Obviamente, não há nenhum problema em fazer orações em público, como por exemplo na igreja, mas o genuíno discípulo não faz da sua oração um discurso de autoglorificação. A oração privada deve ser o alicerce das orações feitas em público. Sem vida privada de oração, as orações em público podem resultar em espetáculo. A oração particular é o melhor treinamento para a oração pública. Não há nenhum problema em repartir o que Deus tem nos dado com outros menos favorecidos, mas isto não deve ser feito visando glória pessoal e destaque. Sermos generosos e misericordiosos é bíblico, mas a vanglória sobre estes atos é plenamente carnal. É diabólico tentar construir a nossa reputação com propaganda de atos piedosos, que visam alimentar o nosso ego. Portanto, é necessário muito cuidado com o que fazemos como representantes do Senhor.


2) Porque Cristo enfatizou o padrão superior da verdadeira piedade
“não toques... como fazem os hipócritas” (vs. 2)
"não sereis como os hipócritas" (vs. 5)
"não vos mostreis contristados tal como os hipócritas" (vs. 16)

As recomendações repetitivas do texto (não toques, não sereis, não vos mostreis) servem para salientar que o que Cristo requer dos seus seguidores é um procedimento muito superior. Nesta exortação do Mestre, há um contraste implícito entre duas concepções de vida: uma superficial e cheia de falsidade e uma altaneira e autêntica. O padrão de Cristo para os discípulos ultrapassa em muito a justiça mesquinha dos homens, por isso ele mesmo alertou: “Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus” (Mt. 5:20). Visto que a justiça dos fariseus estava corrompida por intenções medíocres e razões maliciosas, o discípulo de Cristo deve mirar o padrão de excelência que o próprio Mestre demonstrou. Jesus não era um ator representando um papel, Ele era a própria verdade encarnada entre os homens pecadores. Os hipócritas eram atores de palco que se apresentavam representando um estereótipo, mas, na concepção de Jesus, hipócrita é alguém que usa atos de piedade deliberadamente para esconder seus pecados e promover o benefício próprio. Os hipócritas escondiam-se atrás de máscaras; da mesma forma podemos estar interpretando um papel com objetivos mesquinhos e sem avanços efetivos na vida cristã. O discípulo não deve adotar um estilo de vida marcado por rituais e falso moralismo, tal como os fariseus.

Ilustração: a vida de Daniel é um forte exemplo de alguém que não se deixou levar pelo padrão que estava a sua volta. Mesmo sendo levado cativo para uma terra estranha e hostil, Daniel resolveu firmemente não se contaminar com as iguarias que eram oferecidas nos banquetes do rei da Babilônia. Não se tratava de adotar uma mera dieta diferenciada. Daniel tinha como objetivo um padrão superior de conduta que estava alinhada com a pureza diante de Deus. Ele não seria incomodado se adotasse os mesmos alimentos, mas sua consciência estava cativa à autoridade de Deus, e por isso não se deixou contaminar. Daniel, a despeito das perdas, não foi um jovem influenciado, mas um influenciador. Ele não negociou seus valores, não se corrompeu e não se mundanizou. O desafio é sermos cristãos resolutos e constantes em nossa decisão de agir com base no padrão elevado da Palavra de Deus, cristãos acima da média.

Precisamos marcar esta geração pela diferença adotando o estilo de vida reto. Mesmo que a maioria das pessoas se porte com base em conveniências, o cristão genuíno não se conduz como a maioria. Somos convocados a viver “fora da moda”, rumando sempre contra a maré que tenta nos impulsionar a abandonar princípios e valores do reino em prol da aceitação popular. A vida não é um palco de teatro no qual representamos um papel, somos chamados a viver a realidade de um padrão superior que segue na contramão de qualquer conveniência. Neste mundo, não há padrão moral e ético mais elevado do que o Cristianismo; nenhuma filosofia humana pode ser comparada com os ensinos e sabedoria provenientes das Escrituras. Enquanto as pessoas deste mundo se nivelam por baixo, o cristão busca o que é superior e age conforme um cidadão dos céus.

O Evangelho está tão diluído em nossos dias, que a decisão de adotar o padrão superior de conduta muitas vezes encontrará resistência até dentro dos arraiais cristãos. Por isso é que as máscaras são colocadas, mas e quando a máscara cair? Deus requer autenticidade em nossos atos, pensamentos e decisões. John Stott escreveu: “A justiça que agrada a Deus é a justiça motivada pelas razões corretas, que brotam de um relacionamento correto com Deus.” Temos o auxílio do Senhor para evidenciarmos o padrão digno do Evangelho de Cristo que nos resgatou das trevas. Somos constrangidos pelo Seu imenso amor a vivermos de modo coerente com os Seus ensinos, nos distanciando cada vez mais das encenações teatrais revestidas de piedade. Fomos chamados para sermos discípulos que fazem a diferença e buscam a excelência.


3) Porque Cristo enfatizou o valor inestimável da verdadeira piedade
"...eles já receberam a recompensa." (vs. 2; 5; 16) – Valor efêmero
"...e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará" (vs. 3, 6, 18) – Valor duradouro

Os fariseus se contentavam com o reconhecimento e aplausos dos homens ao redor. No entanto, os aplausos dos homens servem para alimentar o ego apenas por um certo momento, e depois é necessário mais empenho para obter mais reconhecimento: é um verdadeiro círculo vicioso. Cristo ressalta que esta busca por ninharias está em total contraste com o eterno peso de glória reservada aos discípulos genuínos, que são e serão recompensados diretamente pelo Pai. O que é duradouro (recompensa eterna) entra em contraste com o que é efêmero (eles já receberam sua recompensa). Nosso velho homem gosta muito de aplausos, e na maioria das vezes somos movidos por aplausos. Em submissão à Cristo, o discípulo reconhece que importa muito mais ter o louvor do Senhor sobre as nossas vidas do que o louvor humano. O valor inestimável da verdadeira piedade está alicerçado na pessoa de Deus que promete recompensar de modo abundante os servos piedosos. Por isso, o discípulo de Cristo busca satisfação em ter a aprovação de Deus sobre a sua vida: “muito bem, escravo bom e fiel, entra no deleite do Teu Senhor”.

Ilustração: O missionário americano Jim Elliot sabia do valor inestimável de ter aprovação do Senhor. Ele e outros missionários resolveram levar o Evangelho para a tribo dos Aucas no Equador, que era totalmente hostil a qualquer pessoa de fora. Jim disse: “Não é tolo aquele que dá o que não pode guardar para ganhar o que não pode perder.” Mesmo em face da morte, ele mirava a recompensa eterna, que não se compara a nada neste mundo cheio de enganos.

Existem recompensas para o povo fiel que não se omitiu de servir humildemente a Cristo, mesmo com a constante pressão de agradar aos homens. Tanto recompensas terrenas, quanto eternas, administradas e entregues pela boa mão do nosso Deus. A própria alegria de quem foi abençoado por alguma atitude do cristão já deve ser considerada como uma grande recompensa. Ter um coração livre e generoso para ser um canal de graça, por si só já se constitui numa grande recompensa, afinal “mais bem-aventurado é dar que receber” (At. 20:35). Para o cristão, ter momentos em que pode desfrutar da comunhão com Deus em oração e comunhão com Sua Palavra é uma recompensa que dispensa qualquer outra satisfação nesta vida. Ser nutrido e alimentado pelas verdades eternas que aprimoram os nossos valores, é uma recompensa que nenhum louvor humano pode substituir. Mais uma maravilhosa recompensa: quando observamos o caráter de Cristo sendo formado em nós por conta do agir santificador de Deus. Não há recompensa maior do que sermos “herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo” (Rm. 8:17).

Os galardões são as benditas recompensas eternas que estão reservadas aos santos. Jesus falou muito sobre galardões eternos que estão prometidos aqueles que sofreram perseguição em Seu nome ou pela fidelidade ao chamado. O escritor da carta de Hebreus nos fala que uma das evidências da fé genuína é apoiar-se neste fato: “De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador (alguém que recompensa de forma justa) dos que o buscam” (Hb. 11:6). O ensino do apóstolo Paulo é que as realizações de cada crente serão galardoadas diante do Bhema: “Pois importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo.” (2 Co. 5:10).

A certeza da recompensa futura deu ao apóstolo Paulo uma ousadia inabalável para testemunhar a respeito de Cristo Jesus até o crepúsculo da sua vida (2 Tm. 4:7-8). Obviamente, isto não deve nos tornar mercenários (caçadores de galardão), mas cristãos cada vez mais comprometidos com a corrida que nos está proposta. Muito embora Deus não seja obrigado a nos recompensar, faz parte da Sua natureza ser dadivoso e Ele regozija-se em galardoar os Seus filhos amados que cumprem o Seu querer. Grande riqueza é ter o sorriso de Deus sobre nós!

 

Sermão pregado dia 23/11/2014
IGREJA BATISTA REGULAR JARDIM AMAZONAS
Soli Deo Glori

sábado, 22 de novembro de 2014

A parábola dos dois filhos

Texto: Mateus 21:28-32

Somente no Evangelho de Mateus encontramos a parábola a respeito dos dois filhos. Ele é caracterizada por ser curta e simples. Em resumo, a parábola nos ensina que a pessoa que se recusa a fazer o que lhe é pedido, mas que mais tarde muda de ideia e faz a tarefa, é melhor do que aquela que promete cuidar de suas obrigações, mas nunca as realiza.

Jesus contou que certo pai possuía uma vinha que era a fonte de renda da família. Esta vinha deveria ser cultivada por todos os membros da família. Fazia parte da cultura judaica os filhos estarem diretamente envolvidos no cultivo das videiras para sustento da casa.

O pai se dirigiu então ao primeiro filho, que de maneira polida concordou em ir trabalhar na vinha: “Sim, Senhor”. Ele mostrou cortesia e respeito ao seu pai. O problema é que este não foi para a vinha. Este primeiro filho iguala-se aos líderes religiosos (escribas e fariseus) cuja justiça própria os impede de responder bem a qualquer chamada ao arrependimento. Eles se mantêm rebeldes e não admitem a necessidade de mudança de direção. São os justos que se acham bons, honram a Deus com palavras, mas não estão dispostos a obedecer na íntegra ao que diz a Palavra de Deus.

O pai se dirigiu ao segundo filho e disse-lhe para ir trabalhar na vinha. O filho sem se preocupar em mostrar cortesia ao seu pai, respondeu apenas: “Não quero”. Sua má vontade prevaleceu naquele momento, mas depois, arrependido, foi trabalhar na vinha. O segundo filho, que se nega a ir, mas depois muda de ideia e vai, corresponde aos publicanos e pecadores que, embora de início estivessem longe de ser justos, depois se arrependeram e mudaram de postura como resultado da pregação do Evangelho.

Embora seja uma parábola curta e simples, a sua mensagem não é de modo algum trivial. Ela nos mostra o ensino presente em todas as páginas das Escrituras: É melhor obedecer do que ter um excelente discurso evangélico. Obediência que implica em mudança prática de direção na vida. Jesus disse aos seus discípulos em outra ocasião: “Vós sois meus amigos se fazeis o que eu vos mando” (Jo. 15:14). O próprio Jesus falou abertamente contra aqueles que honravam a Deus com os lábios e cultivavam uma aparência piedosa, mas que não se dobravam diante da autoridade dos Seus ensinos. Ele questionou os que não lhe prestavam obediência: “Por que me chamais Senhor e não fazeis o que eu vos mando?”

O cristianismo bíblico não é para ser vivido com base em verborragia vazia. Muitos que se dizem servos de Deus apenas fazem belas confissões de fé sem implicações práticas. Como cristãos, precisamos seguir os passos de Jesus e devotar-lhe obediência irrestrita pois o nosso objetivo deve ser avaliarmos a nós mesmos como servos inúteis: aqueles que fazem apenas o que foi mandado. A auto-avaliação como servos inúteis já está de bom tamanho, já que a essência do ensino de Cristo pode ser resumida nas palavras de Tiago: “Tornai-vos pois praticantes da Palavra, e não somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos” (Tg. 1:22).


Programa Viva com Cristo
Série: As parábolas que Jesus contou

sábado, 15 de novembro de 2014

O credor sem compaixão

No Seu ministério, Jesus fortemente condenou o espírito orgulhoso, impiedoso e sem compaixão de pretensos religiosos, e isto fica bastante claro na parábola do servo incompassivo, peculiar ao Evangelho de Mateus (Mt. 18.23-25). A parábola nos mostra a figura de um rei, bastante compassivo e bondoso, que perdou ao seu servo uma dívida muito grande. Depois observamos o servo que foi perdoado agindo sem a menor compaixão com outro conservo que lhe devia uma quantia infinitamente menor. Em vez de compartilhar com esse conservo a alegria do perdão que havia recebido, o servo perdoado o maltratou e exigiu que lhe pagasse toda a dívida.

A pergunta-chave que nos resta desta parábola é a seguinte: Uma vez que havia sido perdoado, o servo não deveria também perdoar o seu próximo? Ou: uma vez que recebemos um perdão tão imenso do Senhor não deveriamos nós agir com graça para com nossos irmãos?

Deus nos perdoou de uma dívida eterna, que nenhum homem teria condições de pagar. O preço deste perdão foi elevadíssimo, o preço do sangue puro e santo do Cordeiro de Deus, Cristo Jesus. O cristão que foi remido por este sangue estava totalmente falido espiritualmente, caído em pecado e rumava para a morte. Mas Deus, que é rico em misericórdia e graça, tomou a iniciativa de amar de modo abundante, e fez o que é humanamente absurdo: perdoar os próprios ofensores que não tinham mérito nenhum. Então, você e eu, que somos cristãos precisamos entender que o perdão que nos alcançou não cabe em nenhuma definição humana, pois a graça de Deus vai muito além do nosso raciocínio e lógica.

Mas quando estamos na posição de credores e encontramos pessoas que estão em dívida em relação a nós? Talvez alguém que nos causou algum mal, ou que não nos ajudou quando precisamos. Será que estas pessoas terão a oportunidade de enxergar em nossas atitudes o mesmo perdão que um dia nos alcançou através de Cristo Jesus? É pela forma de tratar os outros que revelamos a verdadeira condição de nosso coração. Quando nosso coração é humilde e contrito, perdoamos nossos irmãos com prazer sem exigências mesquinhas. Mas onde há orgulho e desejo de vingança é porque não houve verdadeiro arrependimento. A forma como tratamos os que nos devem indica claramente se somos ou não filhos de Deus, se fomos ou não regerados pelo graça perdoadora do Senhor e se há em nós a verdadeira fé que brota da ação do Espírito Santo.

Será se já não é hora de você descer do seu pedestal de orgulho e tratar os outros da forma como Deus tem lhe tratado? Se o nosso objetivo é de fato honrar a Deus por meio dos nossos relacionamentos, precisamos desistir de viver de modo egoísta e sem piedade para com o próximo. Não podemos agir como credores sem compaixão, pois todos os dias precisamos da compaixão divina em nosso favor, senão seríamos duramente consumidos.

"Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós" (Colossenses 3:13).


Programa Viva com Cristo
Série: As parábolas que Jesus contou

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Um namoro excelente

A chave para qualquer relacionamento e para qualquer decisão correta na vida é a INTEGRIDADE. No relacionamento com Deus, Ele requer de nós integridade, o que envolve devotar-Lhe todo o nosso ser (coração, alma e entendimento) em amor e obediência. Deus não se agrada que sejamos pessoas divididas entre duas ou mais afeições, pois Ele se relaciona com a inteireza do nosso ser. A integridade também deve ser a marca de nossas amizades. Não podemos criar vínculos fortes com nossos semelhantes sem que a inteireza de propósitos e expectativas sejam colocadas à mesa. É triste ver relacionamentos que se rompem com facilidade porque não há integridade por parte das pessoas envolvidas. Da mesma forma, quando pensamos em namoro cristão com excelência é fundamental que haja integridade entre o casal, até porque o propósito maior dos laços estabelecidos no namoro é o estreitamento de vínculos para o casamento. Se não for este o propósito, perde-se totalmente a direção e não haverá avanço efetivo no relacionamento a dois.

O namoro cristão não deve ser uma espécie de passatempo ou apenas enrolação. Quando não há uma visão orientada para o futuro, apenas com ênfase em viver a intensidade do momento "aqui e agora", o casal de namorados corre um sério risco de contrair a paixonite aguda. Por isso que o casal cristão de namorados deve rejeitar de pronto a mentalidade mundana que é vendida nas propagandas e filmes do cinema. O homem e mulher que desejam honrar a Deus não devem se submeter ao padrão vigente nesta sociedade que jaz no maligno, pois o padrão de Cristo para os remidos é mais elevado e mais excelente.

Concentrar na intimidade física é claramente pecaminoso. Deus exige pureza sexual do Seus filhos. E Ele faz isso para o nosso próprio bem. O envolvimento físico na maioria das vezes distorce a perspectiva de cada um dos namorados e os leva a tomar decisões erradas. Muita energia desnecessária é gasta no processo de aumentar a intimidade física de um casal, mas os resultados não serão proveitosos. O envolvimento físico faz com que duas pessoas se sintam próximas, quando na realidade seus corações estão totalmente distantes um do outro. Assim, o relacionamento é nada mais do que uma ilusão.

Com base no que o pastor Hernandes Dias Lopes postou no início deste ano, quero comentar alguns pontos que se referem ao namoro entre cristãos. O namoro pode ser a antessala de um bom casamento ou o prelúdio de um grande desastre. Para se ter um bom namoro, alguns princípios devem ser observados:

1) Ouvir os conselhos dos pais (honrar e submissão os pais é fundamental, em qualquer estágio de nossas vidas, pois os nossos pais são autoridades constituídas por Deus para nos orientar);

2) Namorar uma pessoa de caráter (busque ser alguém que se submeta aos valores e princípios cristãos, e procure uma pessoa assim também);

3) O namoro precisa ser respeitoso (nada de querer se aproveitar da outra pessoa, fazendo dela um objeto para satisfação de desejos carnais e egoístas);

4) O namoro precisa objetivar o casamento (se não há este objetivo, é melhor que não dar prosseguimento ao relacionamento, evitando maiores frustrações e pecados ao longo do tempo);

5) O namoro precisa ser regado de afeto e não de atitudes egoístas, possessivas, ciumentas e agressivas (os frutos do Espírito devem estar presentes em qualquer relacionamento: amor, alegria, paz, longanimidade, fidelidade, mansidão, domínio próprio);

6) O namoro precisa ser com uma pessoa que conheça a Deus (namorar com ímpios é uma afronta ao Senhor que nos remiu por meio de um alto preço, um jugo desigual não vai acabar bem);

7) O namoro precisa tornar os namorados mais felizes (quando o namoro aprisiona os dois num relacionamento centralizador, até com agressões verbais ou físicas, é um claro sinal de que o trem não está nos trilhos).

O homem que pretende namorar deve ser homem o suficiente para tratar uma mulher corretamente, sabendo que está submisso ao que Deus diz em Sua Palavra, esforçando-se para ser verdadeiro e íntegro em todas as suas ações. As mulheres devem lembrar sempre que o seu namoro precisa apresentar um padrão elevado, exigindo tudo que é real e honesto para o bem do relacionamento. Os bons namoros exigem trabalho, paciência, autodisciplina, sacrifício e submissão. Nesta trilha haverá choro e dor, mas os resultados produzidos serão excelentes, sem os quais o casamento não resistirá às tempestades e dificuldades da vida a dois.

Como servos e filhos de Deus, o homem e mulher cristãos precisam rejeitar com vigor as noções egoístas de que o namoro tem a ver com o que pode ser obtido ao invés do que pode ser dado. O apóstolo Paulo escreveu: “Não atente cada um para o que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros” (Filipenses 2:4). Além disso, cada relacionamento é uma oportunidade para dar forma e expressão ao amor de Cristo. O mundo saberá que seguimos a Cristo pela maneira como amamos uns aos outros. É nosso privilégio como cristãos mostrar a este mundo em trevas um padrão excelente de um namoro que visa a glória de Deus, sem artíficios carnais, mediocridade ou chantagens emocionais.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Contracultura cristã

Comentando sobre o discurso mais conhecido de Jesus, o Sermão do Monte, John Macarthur nos apresenta um resumo bem claro das palavras do Mestre. Observe que Jesus deixou evidente que a mensagem do cristianismo que Ele mesmo inaugurou é diametralmente oposta a tudo que este mundo defende e valoriza.

Os “pobres em espírito” (v. 3) são os que sabem que não têm recursos espirituais próprios. Os que choram” são pessoas contritas, que realmente sofrem por causa de seus próprios pecados. Os humildes” (v. 5) são os que realmente temem a Deus e sabem que não são dignos à luz da santidade de Deus. Os que têm fome e sede de justiça” (v. 6) são os que, tendo se desviado do pecado, anseiam o que Deus ama. Essas quatro bem-aventuranças são qualidades internas da fé autêntica. Descrevem o estado do coração do cristão. Mais especificamente, descrevem como o cristão se vê diante de Deus: pobre, triste, humilde e com fome.

As últimas quatro bem-aventuranças descrevem as manifestações externas dessas qualidades. Concentram-se principalmente no caráter moral do cristão e descrevem como deveria ser o cristão autêntico para um observador objetivo. “Os misericordiosos” (v. 7) são os que, como beneficiários da graça de Deus, estendem essa graça aos outros. “Os puros de coração” (v. 8) descrevem pessoas cujos pensamentos e ações são caracterizados pela santidade. “Os pacificadores” (v. 9) referem-se principalmente àqueles que espalham a mensagem da “paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo” (Romanos 5:1) — que é a única paz verdadeira e duradoura. E, obviamente, “os perseguidos por causa da justiça” (Mateus 5:10) são cidadãos do reino de Cristo que sofrem por causa de sua associação e de sua fidelidade a Ele. O mundo os odeia porque odeia Cristo (João 15:18; 1 João 3:1,13).

A ordem é significativa. Quanto mais à risca a pessoa viver de acordo com as sete primeiras bem-aventuranças, mais sofrerá a perseguição mencionada na oitava. Todas essas qualidades divergem radicalmente dos valores do mundo. O mundo valoriza mais o orgulho do que a humildade, ama a alegria ao pranto, acredita que a agressividade obstinada é superior à verdadeira mansidão e prefere a satisfação dos prazeres da carne a uma sede da verdadeira justiça. O mundo considera com total desprezo a santidade e a pureza de coração, desdenha todo pedido de paz com Deus e constantemente persegue quem é, de fato, justo. Jesus não poderia ter inventado uma lista de virtudes que estivesse mais em desacordo com sua cultura.

 

JOHN MACARTHUR
LIVRO: A OUTRA FACE DE JESUS

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Sem comparação

Texto: Salmo 30

Comparações são inevitáveis. Estamos sempre fazendo algum tipo de comparação. Há coisas que a nossa mente consegue estabelecer com facilidade um parâmetro de comparação, como por exemplo a distância entre cidades dentro do nosso estado (em km) ou o tamanho das pessoas da nossa família (em metros). Mas quando analisamos distâncias dentro do universo ou tamanho de planetas e estrelas, os parâmetros de comparação fogem da nossa realidade. Por isso os cientistas criaram uma unidade astronômica para medir a distância no Universo, o ano-luz, que é a distância que a luz percorre no período de um ano (aproximadamente 10 trilhões de quilômetros). O Sol é uma estrela de diâmetro 100 vezes maior que o diâmetro do planeta Terra. A distância aproximada da terra ao Sol é de 150 milhões de km. Uma comparação aproximada, se o Sol fosse representado como uma bola de futebol, a Terra teria o tamanho de uma ervilha distante 30m. Depois do Sol, a estrela mais próxima da Terra é Alfa-Centauro, distante cerca de 40 trilhões de km.

Se já ficamos admirados com a imensidão do universo com suas dimensões incomparáveis, o que diremos diante da grandeza do Criador do universo? Ele é incomparável em Sua natureza e poder. A pena do profeta Isaías em vários textos coloca forte ênfase na singularidade do Senhor, pois não há nada que possa ser comparado com o nosso Deus. “Com quem comparareis a Deus? Ou que coisa semelhante confrontareis com ele?” (Is. 40:18) “A quem, pois, me comparareis para que eu lhe seja igual? — diz o Santo.” (Is. 40:25) “Lembrai-vos das coisas passadas da antiguidade: que eu sou Deus, e não há outro, eu sou Deus, e não há outro semelhante a mim." (Is. 46:9) “Porque desde a antiguidade não se ouviu, nem com ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu Deus além de ti, que trabalha para aquele que nele espera.” (Is. 64:4).

Não há comparação que lhe faça jus, porque Deus é o totalmente OUTRO, entronizado entre querubins, mas ao mesmo tempo presente e pronto a perdoar o contrito. Os pensamentos do Grande Eu Sou são incomparáveis com qualquer pensamento mais elaborado que possamos ter (Isaías 55:8-9). Ele é tão singular e incomparável que só pode ser conhecido porque tomou a iniciativa de se comunicar conosco.

O salmo 30 é nos apresenta as obras de um Deus incomparável. O salmista, após passar por um forte revés na vida, traça neste salmo uma argumentação muito claro para nos comunicar como Deus o tratou de modo especial. Para Davi não apenas Deus é incomparável em seu Ser, como também o modo como Deus tratou o seu servo está acima de qualquer comparação. Por isso o tom de júbilo domina este pequeno salmo. No verso 4 Davi faz uma convocação solene: “Salmodiai ao Senhor, vós que sois seus santos, e dai graças ao seu santo nome”; assim como o salmista, todos nós devemos reconhecer também o modo especial e incomparável como Deus tem nos tratado como filhos amados. Por isso eu afirmo o seguinte:

“Nada se compara com o tratamento especial do Senhor em prol do Seu povo amado”

S.I. Com base no Salmo 30, quais são os fatores que me levam a afirmar que nada se compara com o tratamento especial do Senhor em favor do Seu povo amado?

E qual a relevância de sabermos disto? É relevante porque a forma como Deus nos trata deve nos constranger a uma mudança efetiva em nosso viver. Somos tão beneficiados por este Deus, que nossa postura certamente será diferente, teremos maior anseio por santidade e almejaremos agradá-Lo cada vez mais. Uma pergunta a ser feita ao final desta mensagem é: Que tipo de cristianismo você vive à luz do tratamento especial do Senhor em sua vida?

1) O controle divino sobre a afronta que nos sobrevém (vs. 1)

O Salmo inicia-se com um tom de louvor exultante. Davi irrompe em louvor porque tinha plena consciência do controle minucioso exercido pelo Senhor sobre a sua vida. O salmista reconhece que foi a boa mão do Senhor que não deixou que houvesse comemoração e algazarra dos inimigos pela derrota de Davi. Os inimigos de Davi não iriam além do que já tinha sido estabelecido pelo próprio Deus. A NVI traduziu assim: “não deixaste que os meus inimigos se divertissem à minha custa.” Não podemos estipular em que momento da vida de Davi este salmo foi escrito, mas é fato que este homem tinha muitos inimigos (tanto domésticos quanto estrangeiros) que o invejavam pela posição que ocupava no plano de Deus. As afrontas dos inimigos de Davi só iriam até o que Deus estipulasse, a hostilidade não passaria um milímetro a mais além do soberano plano do Senhor.

Como ilustração, podemos pensar em três inimigos de Neemias que criaram contendas e inventaram mentiras para trazer desânimo na reconstrução dos muros de Jerusalém. Eles ridicularizavam aquele empreendimento Seus nomes eram Sambalate (horonita) e Tobias (amonita) e Gesém (arábio), e foram pedras no sapato dos judeus liderados por Neemias. Mas o que me chama a atenção é que Neemias não esmoreceu e perseverou naquela grande obra. Este homem conhecia o controle de Deus profundamente sobre tudo e sobre todos (Ne. 4:15).

Este fator de tratamento especial do Senhor em favor do seu servo é um poderoso antídoto contra o desânimo quando somos afrontados por ímpios. Vivemos em mundo mergulhado na mais densa treva espiritual, e portanto, um mundo que jaz no maligno. E por conta disso, o desdém dos ímpios e a afronta que nos sobrevém diariamente, é ultrajante e deplorável. Mas podemos ter a certeza de que nenhuma afronta ou hostilidade sofrida estará fora do controle divino. Por um certo tempo, os ímpios podem ter a falsa sensação que estão sendo vitoriosos ao nos caluniarem ou nos perseguirem, mas eles não fazem ideia de que não lutamos com nossas próprias forças. Lutamos com armas espirituais, não carnais. Estas armas são espirituais são poderosas para nos manter de pé, porque estão alicerçadas na Palavra de Deus que não pode falhar.

Há lições a aprender quando somos hostilizados por conta da verdade. Há muitos ensinos que o cristão piedoso deve absorver quando sofre afrontas por servir a Cristo. Mas o principal é que é um privilégio ser considerado digno de sofrer injustiças por ser identificado como cristão e quando somos afrontados por causa do bom nome de Cristo. Triste é quando somos afrontados porque nossas vidas não condizem com o que pregamos, porque somos uma fraude e não há evidências das mudanças que Cristo faz. Outra lição é que há um limite para as afrontas que iremos sofrer, porque Deus conhece perfeitamente a nossa estrutura. Deus conhece até onde podemos suportar e se Ele não interviu ainda é porque não chegamos no limite de resistência.

Como cristãos, não nos cabe apelar à vingança. Precisamos ter um coração confiante no controle de Deus e na Sua justa retribuição a todos que nos causaram algum mal. Davi teve a oportunidade de acabar com a vida de Saul numa caverna, mas não fez isto porque sabia que a justa retribuição seria dada pelo Senhor mesmo. Paulo escrevendo aos romanos: “não vos vingueis a vós mesmos, amados, ... porque está escrito: A mim me pertence a vingança; eu é que retribuirei, diz o Senhor.” (Rm. 12:19), uma citação de Deuteronômio 32:35. Deus nos trata de modo especial não deixando que as afrontas ultrapassem o limite, e Ele mesmo fará justiça ao Seu tempo. Isto nos dá coragem para resistir e força para prosseguir, apesar da forte oposição.

2) O amparo divino diante da angústia que nos assola (vs. 2-3)

Apesar de falar sobre ter sido sarado (curado) e ter ido à beira da morte, não podemos restringir a angústia deste servo de Deus somente a alguma enfermidade mortal. De modo figurativo, o texto ilustra que Davi atravessava um vale muito profundo e Deus o restaurou por Sua graça. As palavras utilizadas, “da cova fizeste subir a minha alma”, em poesia hebraica, denotam que Davi foi completamente restaurado depois de uma angústia severa. Esta forma de comunicar uma grande aflição é comum no hebraico: estar completamente submerso em angústia por todos os lados é como descer a uma cova profunda. Portanto, ser restaurado à vida diz respeito a uma nova e clara percepção dada por Deus em sua graça e favor sem par. “Pois grande é a tua misericórdia para comigo, e me livraste a alma do mais profundo poder da morte” (Sl 86:13) e “Bendize ó minha alma ao Senhor, porque Ele é quem da cova redime a tua vida e te coroa de graça e misericórdia” (Sl. 103:4). As feridas e dores na alma de Davi foram plenamente curadas pelo amparo eficaz proporcionado pelo Senhor. De fato, Deus efetuou uma obra transformadora no coração de Davi, de dentro para fora.

Certa vez pediram para uma criança resumir o Salmo 23 com suas palavras. Ela resumiu com uma pergunta bem simples, porém não simplista: “O Senhor é o meu pastor - o que mais posso querer?” (Wiersbe). Ovelhas são animais extremamente frágeis: entregues a si mesmas definham e podem até morrer de fome/sede, porque precisam do auxílio do pastor. Neste salmo, percebemos que Davi conhecia bem o seu supremo Pastor e por isso afirmou: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo; o teu bordão e o teu cajado me consolam.” Se somos de fato cristãos, nós precisamos experimentar na prática o amparo sempre eficaz proporcionado pelo Senhor quando as aflições deste mundo nos amedrontam e nos causam dor. Tal como uma ovelha frágil, Davi enxergava o amparo proporcionado pelo Senhor em meio aos momentos de angústia que teve que enfrentar.

Todos nós seremos expostos a angústias e aflições neste mundo. Não há como escapar das dores e contusões que a vida nos reserva. Expostos aos efeitos devastadores do pecado tanto nosso como de terceiros, teremos lutas contra a tristeza em alguns momentos desta vida. Mas o que não podemos perder de vista, é que Deus não nos desampara nem por um momento só. O compositor Sérgio Pimenta, de um modo magistral resumiu bem o amparo sempre presente do Senhor: Nem um momento só / Deixou-me o Seu olhar / Nem quando eu dava dó / Negou-me o Seu amar / Nem mesmo quando me omiti / Como se pudesse me esconder / Nem mesmo quando não vi solução/Negou-me Seu perdão / Negou-me Sua mão.

O cristão que vive encharcado em angústia e não encontra alento para viver, na verdade não se supriu do gracioso amparo divino, que está sempre à disposição. Sabemos que somente o Senhor é a fonte de verdadeira paz em meio às guerras e que Ele é a fonte de verdadeira alegria em meio às aflições, então não podemos ficar nos cantos da vida, à margem de uma espiritualidade saudável. Não vamos andar ansiosos e cabisbaixos, porque temos um tratamento especial do Senhor que nos oferece o Seu auxílio amoroso todos os dias. Não vamos ser dominados pela murmuração porque temos um Deus que sabe de fato o que é melhor para nossa vida. Preguemos para nós mesmos a verdade bendita do Salmo 42: “Por que estás abatida, ó minha alma? Por que te perturbas dentro de mim? Espera em Deus, pois ainda o louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu” (Sl. 42:11). Isto não é um apelo psicológico, é uma certeza teológica que deve nos governar todos os dias, modificando nossos hábitos e atitudes no olho do furacão.

3) A correção divina por conta da presunção que nos domina (vs. 6-7)

Davi entrou num estágio de prosperidade, no qual aparentava estar totalmente seguro. Ele presumiu que nada poderia o abalar. A tranquilidade e a prosperidade de um reino estável trouxe-lhe a presunção da autoconfiança (um inimigo mortal do servo de Deus), que foi imediatamente reprovada pelo Senhor. Deus não tolera arrogantes, que se arvoram na sensação de falsa segurança que o dinheiro, o poder, a capacidade e os talentos podem lhe trazer. Davi sofreu um duro golpe quando deixou-se iludir pela visão altiva que teve a respeito de si mesmo. Quando se refere a Deus, a expressão “voltar a face ou voltar o rosto” geralmente tem o sentido de reprovação divina ou disciplina corretiva iminente. Na literatura profética encontra-se bastante esta expressão: “Voltarei o rosto contra eles; ainda que saiam do fogo, o fogo os consumirá; e sabereis que eu sou o Senhor, quando tiver voltado o rosto contra eles” (Ez. 15:7); “Pois voltei o rosto contra esta cidade, para mal e não para bem, diz o Senhor; ela será entregue nas mãos do rei da Babilônia, e este a queimará” (Jr 21:10). O tratamento especial do Senhor na vida de Davi incluiu a disciplina corretiva para que o seu servo não ficasse preso na armadilha da presunção.

O discípulo Pedro ficou dominado pela presunção ao afirmar que estava pronto a morrer por Cristo, mas não colocou em xeque as motivações daquela afirmação. Seu coração foi tomado pelo impulso das emoções e pela vontade de estar à frente dos demais discípulos: “Ainda que todos se escandalizem, eu, jamais!” (Mc. 14:28). Jesus rogou por Pedro para que a fé dele não desfalecesse. O canto do galo foi uma medida corretiva para trazer Pedro à realidade de um compromisso efetivo com o Senhor, para que ele não confiasse em si mesmo. Deus não descartou Pedro, mas tratou o seu servo por meio da disciplina. Aquele cantar do galo serviu como um lembrete permanente a Pedro de que a presunção reflete apenas um coração precipitado e cheio de orgulho. “Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia.” (1 Co. 10:12)

É muito fácil também sermos presunçosos por causa da segurança que o dinheiro ou que as ofertas deste mundo podem nos trazer. Não devemos nos gloriar naquilo que conquistamos ou ainda vamos possuir (Jr. 9:23-24). Porém tudo neste mundo é volátil, por isso precisamos concentrar nossas afeições naquilo que não vai nos frustrar. “Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele. Ora, o mundo passa, bem como a sua concupiscência; aquele, porém, que faz a vontade de Deus permanece eternamente” (1 Jo. 2:15, 17). Realizar o que Deus requer de nós traz significado e propósito a nossa vida, e certamente nos trará verdadeira segurança. Fora disso há somente frustação e desesperança. O que temos e o que somos é somente fruto da bondade de Deus.

Por causa do amor que o Senhor tem para com o Seu povo, Ele não deixará que sejamos fascinados pela falsa paz deste mundo. O profeta Amós alertou: “Ai dos que andam à vontade em Sião e dos que vivem sem receio no monte de Samaria, homens notáveis da principal das nações, aos quais vem a casa de Israel!” (Am 6:2).

Se você um filho de Deus, amado e remido por Ele, será corrigido pelo Senhor se a presunção dominar o seu coração. Há muita malignidade na presunção, pois a presunção busca destronar Deus, oferendo ao homem meios de viver sem prestar contas ao Senhor. “Agora, entretanto, vos jactais das vossas arrogantes pretensões. Toda jactância semelhante a essa é maligna” (Tg 4:16). Nossas decisões precisam ser marcadas pela dependência constante do Senhor, pois não somos um fim em nós mesmos. O presunçoso é um ateu funcional, que se apoia apenas na sabedoria da razão e na inteligência da própria estratégia.

4) O favor divino em prover satisfação que nos revigora (5, 11-12)

O salmista Davi estabelece em todo o salmo 30 o foco em Deus e no tratamento especial que é direcionado ao servo do Senhor. Por conta disso, Davi reconhece com clareza e objetividade que a alegria da qual ele passou a desfrutar é fruto tão somente do favor divino. Este favor é demonstrado de duas formas: 1º) A ira do Senhor não dura para sempre, mesmo que haja pranto e dor, o Senhor se compraz em prover o seu servo com plena satisfação. A linguagem é figurativa e serve para descrever uma guinada ou uma página virada, fruto da ação do Senhor. Alegria em hebraico tem sentido amplo; é muito mais do que um largo sorriso no rosto. É uma profunda satisfação concentrada e arraigada naquilo que imutável: a graça ou favor de Deus. 2º) De acordo com o verso 11, é Deus quem toma a iniciativa de nos tirar o pano de saco e nos cingir de alegria. Que transformação! O choro vira contentamento; as vestes de luto viram vestes de comemoração. Na antiguidade, vestir panos de saco era um sinal de luto ou indicativo de lamento por algum infortúnio. Ser vestido com a alegria que provém do Senhor é estar plenamente satisfeito n’Ele. Este compromisso do Senhor em satisfazer os seus servos com alegria verdadeira não entra em conflito com a glória que somente a Ele é devida (vs. 12).

Uma história que ilustra bem este fato está relacionada com o hino do Cantor Cristão “Sou feliz”. O autor desta letra passou por uma enorme aflição: ele perdeu suas quatro filhas num naufrágio em 1873. Sua esposa escapou da tragédia e o avisou sobre a morte das filhas. Diante de toda a dor e lágrimas derramadas nesta situação, Horatio Gates Spafford encontrou forças para afirmar a sua satisfação em Deus através deste belo hino. A neta de Spafford guardou a quinta estrofe deste belo hino, que só foi divulgada no ano de 1995: “Pra mim só importa Cristo pra viver / Se o Jordão ameaçar me afogar / Oh! Não temerei, pois na morte e na vida / Tu me darás perfeita satisfação”. Não se trata de negação da realidade (muitas vezes terrivelmente cruel), mas se trata de alguém que desfrutou da satisfação que Deus lhe supriu em Cristo e pôde afirmar com segurança: a minha alma vai bem (It’s well it my soul).

Muitas vezes estamos tão fatigados com a noite da adversidade que não podemos contemplar o amanhecer da alegria. Deus tem nos dado razões de sobra para sermos cristãos satisfeitos como a paz em Cristo, a salvação, o perdão, a Sua presença conosco. Mas para usufruirmos desta satisfação, precisamos diagnosticar como está a nossa fé. John Piper define fé da seguinte maneira: fé é o exercício diário da satisfação em Cristo e em Suas promessas. Sem desfrutarmos desta satisfação impossível agradar a DEUS (Hb. 11:6). De fato, nós só seremos crentes maduros, abundantes e úteis para o reino quando estivermos satisfeitos em Cristo. Não temos como ser um farol que aponta para Cristo, se nós mesmos não temos sido nutridos pela satisfação em Sua pessoa. O salmista em outra ocasião declarou: “Tu me farás ver os caminhos da vida; na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra, delícias perpetuamente.” (Sl. 16:11)

Em que fonte você tem saciado a sua sede? Ou em outras palavras: o que ou quem traz satisfação à sua alma? Se você tem buscado esta satisfação em um relacionamento, eu posso afirmar que a frustração se aproxima. Se você tem buscado a verdadeira satisfação numa carreira profissional ou no sucesso material, há um grande problema com o seu cristianismo. Não deixe o manancial de águas vivas para cavar cisternas rotas que não retêm as águas (Jr. 2:13). Jesus disse que veio para termos vida, e vida em abundância. Ou seja, Ele se compraz em nos prover com satisfação completa que traz qualidade e vigor ao nosso viver. Nada se compara com a provisão de Deus em nos suprir com a satisfação em Cristo, como Martinho Lutero disse: “Uma masmorra com Cristo é um trono, e um trono sem Cristo é um inferno.”

sábado, 13 de setembro de 2014

Prestando um culto espiritual

A cidade de Corinto localizava-se numa zona portuária, o que era garantia de prosperidade comercial. Era um ponto de parada natural na rota de Roma para o Oriente, e o lugar onde se encontravam várias rotas do comércio. Havia uma efervescência cultural por conta dos vários povos que por ali transitavam ou fixavam residência. Era a capital da província romana da Acaia.

Leon Morris comenta: “...era um lugar muito cosmopolita. Era uma cidade importante. Era intelectualmente viva. Era materialmente próspera. Era moralmente corrupta. Os seus habitantes eram pronunciadamente propensos a satisfazer os seus desejos.” O verbo corintianizar tomou o sentido de aproveitar desenfreadamente os prazeres da vida.

Paulo iniciou o seu trabalho missionário em Corinto pregando aos judeus e gentios que haviam na cidade (conf. Atos 18). Deus tinha os Seus eleitos naquele lugar conhecido mundialmente como promíscuo e cheio de luxúria. A igreja que nasceu em Corinto ficou sob a liderança de Apolo, mas os irmãos de Corinto significavam muito para Paulo: ele escreve que era pai espiritual deles em Cristo Jesus mediante o evangelho (4:15). A ênfase de Paulo em suas cartas àquela igreja está relacionada principalmente com o uso dos dons espirituais, com a conduta moral do cristão e com o culto que deve ser prestado a Deus.

O CULTO CRISTÃO DEVE SER REGULADO POR PRINCÍPIOS TEOLÓGICOS BASEADOS NAS ESCRITURAS:

1) Decência (o nosso Deus é santo e Sua santidade não deve ser profanada)

A forma como eu e você nos apresentamos para cultuar precisa ser levada em conta. Decência e reverência devem permear todas as nossas atitudes enquanto adoradores. O grande problema é que hoje não há mais a percepção sobre quem é o Deus revelado nas Escrituras, e por conta de uma visão pequena de Deus, o culto se transforma num espetáculo antropocêntrico. Obviamente, a santidade em nossos pensamentos reflete-se imediatamente na forma como adoramos a Deus.

2) Ordem (a bagunça, a bizarrice e as abstrações não devem ter lugar no culto)

Muito do que se vê atualmente na maioria das igrejas evangélicas é uma coleção de cenas que beiram o ridículo. A ordem é fruto do senso de reverência, e portanto, indica claramente como anda a saúde de nossa alma. Esta ordem precisa ser evidente na pregação (proclamação) das verdades bíblicas. Muitos pastores já abandonaram até o texto bíblico e se refugiam apenas em conceitos psicológicos ou mesmo em historietas sem sentido, cujo propósito é somente aliciar ouvintes e não desafiar pecadores a um compromisso efetivo com o Senhor.

3) Edificação (toda prática nociva ao fortalecimento da igreja não deve ser adotada)

A igreja é um corpo, e como corpo, cada membro deve servir de suporte e edificação para o outro. Como membros de uma igreja é fundamental que nossas ações busquem sempre o melhor para o nosso irmão, considerando que o exercício dos dons espirituais deve sempre objetivar o fortalecimento de outros membros. Não podemos viver de modo egoísta querendo apenas ser servidos, uma vez que o nosso Senhor viveu como servo dando-nos o exemplo.

domingo, 7 de setembro de 2014

A parábola do filho mais velho

É comum pensarmos na parábola do filho pródigo e concentrarmos atenção somente na figura do irmão mais novo, que viveu longe de casa e gastou toda a sua herança com os prazeres deste mundo. Esta parábola está registrada em Lucas 15. Mas eu gostaria de concentrar o foco deste texto na figura do irmão mais velho, que não abandonou o seu lar mas estava igualmente perdido mesmo dentro da casa do seu pai.

O irmão mais velho representa na parábola os escribas e fariseus, que eram pessoas consideradas obedientes a Deus e zelosas no seu procedimento. Jesus, conhecendo a realidade dos corações daqueles homens, propôs a parábola justamente para confrontar o orgulho que havia em suas vidas e que eles não queria admitir. É evidente que Jesus mostra o amor gracioso do Pai em receber com grande júbilo o filho mais novo que saiu de casa, mas o Seu principal objetivo é revelar a cegueira, mesquinhez e todo a hipocrisia de homens e mulheres que buscam servir religiosamente a Deus, mas que estão destruindo tanto suas almas quanto a vida das pessoas ao seu redor. Há muitas igrejas cheias de pessoas parecidas com o irmão mais velho, que busca obedecer a Deus com objetivos equivocados.

Nós não devemos obedecer a Deus para conseguirmos a aceitação d'Ele. O crente já é aceito por Deus, através dos méritos de Cristo Jesus, e nada que façamos pode constranger Deus a atender os nossos caprichos pessoais. O irmão mais velho pensava que pela sua obediência ao Pai deveria ser merecedor de glória e honra, e até uma festa deveria ser feita em sua homenagem. Mas na relação com Deus não existe barganha ou troca. Somos o que somos somente pela graça de Deus. O Deus que não poupou o Seu único Filho nos aceita com base no sacrifício perfeito na Cruz do Calvário. Obedecemos a Deus porque já fomos aceitos e somos novas criaturas. É mentira que devemos obedecer a Deus para sermos aceitos ou para ganharmos uma quantia de pontos.

O filho mais velho não conseguia entender a graça demonstrada com o filho mais novo. É como se ele dissesse: “Eu me matei de trabalhar para merecer o que tenho, mas meu irmão nunca fez nada para merecer coisa alguma; em verdade, ele mereceu apenas sua expulsão e, agora está sendo abençoado. Onde está a justiça em tudo isso?” O nosso senso de justiça deve ser redefinido conforme a Bíblia. Precisamos entender que Deus não pensa como nós pensamos, e que os Seus caminhos são totalmente diferentes dos nossos. Aquele filho mais velho se sentia o mais justo dos homens, por isso ficou enfurecido com o tratamento que o mais novo recebeu. Mas Deus redefine o que é justiça apresentando aos dois filhos a oportunidade de um relacionamento restaurado dentro da família. Deus é o padrão perfeito de justiça, que apresenta a situação de total falência espiritual do homem, tanto do filho mais novo quanto do filho mais velho, e nos outorga de graça as Suas preciosas bênçãos.

Constrangidos pelo imenso amor de Deus precisamos desistir de usar o nosso falso senso de justiça para medir as pessoas. Com base nos critérios que as Escrituras nos ensinam, precisamos deixar de lado o orgulho que tanto nos impulsiona a olhar os outros com arrogância, e vivermos em obediência a Deus porque fomos aceitos em Sua presença pelos méritos de Cristo Jesus. E assim seremos livres para desfrutarmos do amor do Pai sem reservas, com temor e bendita comunhão.

sábado, 6 de setembro de 2014

A IGREJA TRIUNFANTE

É preciso fazer uma clara diferenciação entre igreja triunfante e igreja triunfalista. Vivemos numa época de muito triunfalismo e de muita algazarra espiritual fantasiada com rótulo evangélico. A igreja não aprendeu os princípios que devem reger um viver triunfante, que em muito se distancia do que tem sido visto e ouvido na maioria dos púlpitos evangélicos mundo afora.

A igreja triunfante é aquela formada por remidos que, a despeito das adversidades e provações que atravessam, conseguem confiar em Deus resolutamente e admitem que a glória da vida cristã está na vitória diária sobre o pecado com o auxílio dos meios de graça disponibilizados pelo Senhor. A igreja triunfante triunfa somente pelos méritos de Cristo, nunca deve ser enfatizada a ênfase em mérito pessoal nas vitórias conseguidas.

A igreja triunfalista é aquela formada por pessoas interesseiras que, em meio às dificuldades que atravessam, querem determinar que Deus atenda seus desejos humanistas e nunca estão dispostas a reconhecer o perigo de um viver centrado nos prazeres deste mundo (riquezas, prosperidade, saúde e afeições terreais). A igreja triunfalista aprecia o poder exercido pela fé, a ênfase está sempre nos méritos de quem exercita a fé. Se não há cura, é falta de fé; se não há prosperidade é falta de fé. Nas grande maioria das letras de músicas triunfalistas, há um exagero egocentralizado na fé exercida por alguém que busca ser abençoado por Deus.

O tom de vitória em toda a Bíblia é bem claro. Deus comprou um povo para Si mediante o sacrifício do Seu Filho unigênito, e por meio da redenção garantiu a vitória sobre a morte e sobre o domínio do pecado. Portanto, enquanto estamos neste mundo precisamos dar evidências de um viver triunfante e de um cristianismo abundante que reflete a glória de Cristo.

1) UM PROGRESSO EFETIVO NA BATALHA CONTRA O PECADO
Orgulho, ira, maledicência, murmuração: já lidamos com estes pecados adequadamente? Se colocarmos para debaixo do tapete o que deve ser tratado em nosso viver, a nossa vida se parecerá muito mais com um círculo vicioso do que com uma subida progressiva. O pecado sempre nos assediará neste mundo, mas precisamos triunfar diariamente sobre o que nos impede de avançar em direção a um compromisso maior com o Senhor.

2) UM PROGRESSO EFETIVO NO INTERESSE POR VALORES CELESTES
Todos nós temos planos, metas e sonhos. Alguns já sabem que profissão seguir, que rumo tomar na vida, e usam o cristianismo apenas como um apêndice, como se fosse um acessório que se coloca geralmente nos fins de semana. Quando os nossos interesses são consumidos por valores terrenos, toda a nossa saúde espiritual fica seriamente comprometida, e não há nenhum triunfo a ser comemorado. Se almejamos de fato a um compromisso maior com Cristo, precisamos desistir de construir impérios que colocam em evidência o nosso orgulho e ambição pessoais.

3) UM PROGRESSO EFETIVO NO FORTALECIMENTO DAS CONVICÇÕES
Um cristão sem convicções é um difamador do Senhor. Alguém que é levado para todo lado, sem estabilidade nenhuma diante dos fatos tristes e difíceis desta vida, atesta sua fragilidade como discípulo do Mestre. Precisamos ser conduzidos e mantidos de pé pelas convicções bíblicas. Somente as convicções que encontram base nas Escrituras podem nos sustentar quando as tempestades vierem sobre nós. Não podemos falar em triunfo na vida cristã se não estamos dispostos a fortalecer nossas convicções diariamente, quebrando uma série de obstáculos que nós mesmos construímos.

O valor dos bons conselhos

O livro de provérbios por si mesmo é um livro de conselhos. Através de provérbios e ditos, o sábio Salomão traz à tona vários ensinos verdadeiros e úteis para o nosso viver diário. Conselhos são sempre bons, mas somente os bons conselhos. Por isso é importante que você procure se aconselhar com pessoas que podem oferecer palavras verdadeiras e sábias. Mas de antemão já posso garantir que não existe um bom conselho que esteja fora do padrão de ensino das Escrituras.

  • “O caminho do insensato aos seus próprios olhos parece reto, mas o sábio dá ouvidos aos conselhos.” (Pv. 12:15)
  • “Não havendo sábia direção, cai o povo, mas na multidão de conselheiros há segurança.” (Pv. 11:14)

Na Bíblia existe uma história que relata o péssimo conselho dado por um homem chamado Jonadabe. Ele orientou o jovem Amnon a extravasar sua paixão sexual e dormir com a própria meia-irmã. Esta história terrível está registrada no livro 2 Samuel 13.1-22. A Bíblia diz que Jonadabe era homem muito sagaz. A palavra “sagacidade” significa: uma astúcia enganosa ou fraudulenta; esperteza movida por interesses mesquinhos. Amnon foi tomar conselhos com alguém que “não era flor que se cheire.” Jonadabe não era uma pessoa piedosa ou temente a Deus. Seu conselho foi mais um incentivo ao pecado e não tinha nada de proveitoso. Ele sugeriu que Amnom usasse artifícios pecaminosos (mentiras, fingimento, engano) para conseguir o que tanto desejava.

Nem sempre uma pessoa que se interessa em nos ajudar tem o conselho correto. Na luta contra o pecado, boas intenções não são suficientes. Muitas filosofias e pensamentos humanistas invadiram as igrejas como uma enxurrada. Por isso é fundamental buscar o conselho de pessoas piedosas que podem oferecer soluções bíblicas. A Bíblia considera uma enorme insensatez não buscar conselhos, mas é fundamental que os conselheiros sejam homens ou mulheres tementes a Deus. A. W. Tozer nos adverte: “Nunca ouça um homem que não ouve a Deus.” Se seguirmos tal advertência evitaremos muitas dores de cabeça.

Deus utiliza os seus servos para aconselhar sabiamente. Aqueles que possuem o dom de exortação são os mais capacitados para esta tarefa, porém todo crente piedoso pode ser um instrumento na edificação de alguém que precisa de conselhos. É um ministério que exige profunda submissão “ao que Deus diz” e não “ao que eu acho”, por isso somente pessoas submissas à autoridade bíblica podem oferecer a ajuda correta através do aconselhamento.

De quem você tem buscado conselhos? Não busque o conselho de pessoas que desprezam os princípios bíblicos e se baseiam nas filosofias humanas. É importante ter amigos piedosos nos quais podemos confiar quando necessitamos de conselho. Mas não podemos confiar em pessoas que falam coisas agradáveis apenas para nos agradar. Nunca dê crédito aos conselheiros que concordam com o pecado. Aqueles que verdadeiramente nos amam devem falar a verdade e nos alertar sobre os perigos do pecado que sempre nos assedia.

sábado, 30 de agosto de 2014

A mensagem de arrependimento

Evidentemente, desde o começo até ao fim do livro de Atos, o arrependimento era o apelo central da mensagem dos apóstolos. O arrependimento que eles pregavam não era apenas uma mudança de mente a respeito de quem era Jesus. Era um abandono do pecado (At. 3:26; At. 8:22) e um voltar-se ao Senhor Jesus Cristo (At. 20:21). Era o arrependimento que resulta em mudança de comportamento (At. 26:20). A mensagem apostólica não parecia em nada com o evangelho do não-senhorio que tem alcançado popularidade em nossos dias.

Fico profundamente preocupado quando vejo o que está acontecendo na igreja hoje. O cristianismo bíblico perdeu sua voz. A igreja está pregando um evangelho idealizado para confortar, e não para confrontar pecadores. As igrejas têm recorrido a divertimento e entretenimento para tentar conquistar o mundo. Esses métodos podem atrair multidões por um tempo, mas não são os métodos de Deus e, portanto, estão destinados ao fracasso. Enquanto isso acontece, a igreja está sendo infiltrada e corrompida por crentes professos que nunca se arrependeram, nunca se converteram de seus pecados e, portanto, nunca abraçaram, realmente, a Cristo como Senhor ou Salvador.

Devemos retornar à mensagem que Deus nos chamou a pregar. Precisamos confrontar o pecado e chamar os pecadores ao arrependimento — a uma interrupção radical do amor ao pecado e a buscarem a misericórdia do Senhor. Devemos mostrar Cristo como Salvador e Senhor, como aquele que livra seu povo da punição e do poder do pecado. Afinal, esse é o evangelho que Ele nos chamou a proclamar.

John Macarthur, no livro O Evangelho segundo os apóstolos.

domingo, 24 de agosto de 2014

O valor da misericórdia

O livro de Provérbios nos apresenta lições para um viver sábio. E para termos um viver sábio é necessário que entendamos o valor da misericórdia, em prol dos que padecem e precisam da ajuda que podemos dar. Em Pv. 19:22 lemos o seguinte: "O que torna agradável o homem é a sua misericórdia." A misericórdia é uma virtude ausente da nossa sociedade. Neste mundo o que impera é a força bruta, que não respeita o próximo e traz grande sofrimento ao que já está em situação ruim. Em Pv. 21:10 lemos: "A alma do perverso deseja o mal; nem o seu vizinho recebe dele compaixão." Os telejornais, programas de rádio e revistas trazem sempre matérias sobre a falta de misericórdia com o sofrimento alheio. Não faz muito tempo, um homem que andava de bicicleta foi atropelado e teve o seu braço arrancado. O motorista não prestou nenhum socorro e ainda jogou o braço que poderia ser reimplantado num córrego da região. Este é o cenário deste mundo sem misericórdia.

É óbvio que não podemos esperar de pessoas ímpias que não experimentaram a graça de Deus, o exercício da misericórdia em sua forma pura e sem intenções pecaminosas. A misericórdia não é uma virtude natural do homem. O homem em sua natureza é mau, cruel, egoísta, vingativo e incapaz de exercer uma misericórdia verdadeira. Mas os cristãos precisam acordar do sono em que estão para exercer a misericórdia no seu dia-a-dia. Afinal, todo crente foi alvo da misericórdia de Deus, e portanto, deve espalhar as sementes de graça e bondade, onde quer que ande visando sempre a glória do Senhor.

Com base no valor que ela tem, é impotante tratar sobre três aspectos da misericórdia, sob o ponto de vista bíblico:

1) MISERICÓRDIA NÃO É COMPLACÊNCIA COM O PECADO:

Quando alguém está em pecado, o cristão deve aproximar-se com temor e tremor, para agir com misericórdia. Mas isto não significa que o cristão deve concordar com o caminho errado e nem apoiar aquele que está em rebeldia contra Deus. Jesus exerceu misericórdia em tratar os pecadores, mas em momento algum concordou com práticas que estivessem fora do padrão de Deus. O exercício da misericórdia exige do cristão que ele sonde diariamente o seu coração, para que assim possa ter condições de ajudar outros que estão enlaçados pelo pecado. Isto quer dizer, que é necessário primeiro tirar a trave, tratar o que nos impede de enxergar claramente, e assim teremos condições de confrontar biblicamente alguém que precisa de misericórdia, não de complacência.

Paulo escrevendo aos Efésios diz assim: "E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as" (Ef. 5:11). Não é prova de bondade passar a mão na cabeça do pecador e dar-lhe acolhida enquanto permanece em rebeldia contra o Senhor. Isto é cumplicidade com o erro, que trará sérios prejuízos para o reino de Deus. Agir com misericórdia é fazer com que o pecador entenda que está rumando em direção errada, sempre com o objetivo de restaurar o irmão que caiu. Isto sim, é prova de que estamos interessados na vida de alguém.

Deus requer do seu povo que a misericórdia mútua seja sempre cultivada, mas que este prática não se transforme em cumplicidade com o erro, pois isto certamente não resultará em vidas transformadas pela graça de Cristo.

O arrependimento na vida de uma pessoa marca um novo rumo, e devemos sim estender a destra de misericórdia para aqueles que se arrependem e desejam viver agradando a Cristo. Mas sem arrependimento e com a prática contínua do pecado, não devemos pensar que estaremos ajudando sendo cúmplices com o erro. Isto só traz desonra ao nome de Cristo.

2) MISERICÓRDIA NÃO É PRIORIZAR PROGRAMAS DE CARIDADE

Em nome do exercício da misericórdia muitas pessoas fazem obras de caridade, e usam recursos financeiros para ajudar os menos favorecidos. Isto não é de todo errado, mas o problema é quando estas atividades se tornam o foco central. Deus nos agracia com bens para que possamos abençoar a outras pessoas também, mas não podemos esquecer que a mensagem do Evangelho é inegociável. Não devemos atrair pessoas para nossas igrejas com promessas de cestas básicas ou com promessas de ajuda financeira, pois Cristo não está oferecendo estas coisas. O que Cristo requer de nós, seus embaixadores, é que preguemos a mensagem da cruz, que falemos sobre a condenação e sobre a obra graciosa de Cristo para nos libertar da escravidão do pecado. O evangelho de Cristo não pode ser diluídos a favor de obras de caridade. É comum ver muitas pessoas que são atraídas para uma igreja pelos programas sociais, mas não permanecem. Muitos não foram apresentados à mensagem central do Evangelho, ou quando entendem esta mensagem, rejeitam a fé cristã por causa o alto custo de ser um discípulo de Jesus Cristo.

Como cristãos, é fundamental que andemos em novidade de vida, e isto implica em sermos bondosos com aqueles que sofrem necessidades. Devemos prestar ajuda no que está ao nosso alcance, mas isto não significa que o evangelho deve ser diluído em função de caridade e obras sociais. O nosso papel como embaixadores de Cristo é levar ao mundo a redenção providenciada na cruz do Calvário, sem esmorecer e sem enfraquecer a mensagem. Uma igreja que se dedica apenas a obras sociais, sem o foco correto no evangelismo pessoal, pode criar nas pessoas alcançadas um falso senso de segurança. É necessário discipulado em profundidade, para que a misericórdia de Cristo seja vista e entendida por todos que nos ouvem. Isto sim, é o exercício correto da misericórdia: acima de tudo enxergar o ser humano como carente de alma, perdido e que precisa da graça divina. O pão da vida, que é Cristo, traz verdadeira satisfação à alma!

3) MISERICÓRDIA É COLOCAR-SE NO LUGAR DO OUTRO

É fácil sermos indiferentes. É muito fácil sermos apáticos. É só deixar a vida seguir seu rumo, sem nos importarmos com quem está a nossa volta. Mas quando somos alcançados pela graça de Cristo, é impossível olhar este mundo com os olhos secos. Constrangidos pelo imenso amor de Cristo, é impossível vivermos sem enxergar o sofrimento de pessoas ao nosso redor. Isto se torna mais evidente ainda quando nos colocamos no lugar do outro, e deixamos de lado nosso preconceito e arrogância infantil.

Ser misericordioso é estender a mão sem segundas intenções, e sem esperar receber nada em troca. É mostrar com atitudes que se importa com a situação do próximo, sem cumplicidade com o pecado e sem diluir a mensagem do Evangelho. Cristo nos deu vários exemplos de como sermos misericordiosos. Podemos pensar no episódio da morte de Lázaro, um amigo de Jesus. Ele sabia que Lázaro seria ressuscitado, e que o poder de Deus seria manifestado naquela situação de dor e sofrimento. Mas ainda assim Ele se compadeceu de toda a família e chorou junto ao túmulo de Lázaro. Chorar com os que choram é uma demonstração de misericórdia.

Certamente você convive com alguém que sofre, seja por debilidades físicas, emocionais ou espirituais. Eu sugiro que você, meu caro irmão, apresente a mensagem do Evangelho, a única esperança que há em Cristo Jesus, e mostre-se atento às necessidades mais profundas da alma desta pessoa. Coloque-se à disposição para sentir a dor desta pessoa e fazer o que está ao seu alcance para ajudar com os recursos materiais ou espirituais que Deus tem lhe dado. Seja um canal de bênçãos, por onde fluem ricas manifestações da misericórdia que alcançou o seu coração.


Devocional para o Programa Viva com Cristo
Dia 24/08/14

terça-feira, 12 de agosto de 2014

DECADÊNCIA MORAL E ESPIRITUAL

Texto: 1 Sm. 15: 1-31

I. Quando penso em decadência, a ideia que logo vem a minha mente é uma casa ou um prédio em ruínas. Recentemente, vi algumas fotos da casa que meus avós moravam no interior de Araripina. As fotos mostram as ruínas de uma casa grande que abrigou pessoas que hoje lá não vivem mais. Algumas paredes caídas, a ausência do telhado em vários cômodos, blocos espalhados pelo chão, compõem o cenário de um tempo que passou. A decadência de uma casa em ruínas também demonstra que não houve manutenção regular ou uma boa reforma. Ao longo dos anos, o efeito das chuvas, dos ventos e do sol forte contribui diretamente para deteriorar uma casa, e se não houver manutenção, em breve restarão somente ruínas. Porém, muito pior do que uma casa em ruínas, é a decadência da alma, é quando a nossa fé está em ruínas. Quando a alma está deteriorada pelo pecado não-confessado e não-abandonado, ela precisa de uma restauração urgente. A fé em decadência é um testemunho da nossa negligência e apatia para com os valores espirituais.

II. E por falar em decadência, o texto lido nos apresenta mais um episódio trágico na vida do obstinado rei Saul. As atitudes de Saul vão da negligência à rebeldia e comprovam um homem decadente, uma vida que desmorona cada vez mais, tanto do ponto de vista moral quanto espiritual. A história deste homem, escolhido para ser o primeiro rei de Israel, é repleta de contradições que minaram o seu reinado, marcado por inveja, orgulho e declínio.

Ao rei Saul coube a missão de exterminar os amalequitas, uma antiga tribo nômade descendente de Esaú (Gn. 36:12). Os amalequitas não eram um povo inocente. Este povo criou empecilhos para o povo de Israel. Quando os israelitas partiram do Egito rumo à terra prometida, eles foram atacados pelos amalequitas, conforme Dt. 25: 17-19. Foi um ataque covarde, feito pelas costas, aos abatidos e fatigados do povo de Israel. Então havia um justo juízo estabelecido por Deus para os amalequitas. Esta ordem não se tratava de um capricho de um Deus carrasco, mas do exercício da plena justiça do Senhor em prol da vindicação da Sua santidade e Sua glória.

Mas a missão confiada ao rei Saul não foi cumprida na íntegra. As palavras que Saul utiliza para responder a Samuel no texto lido testificam contra ele mesmo e comprovam a obstinação presente em seu coração. Saul era um homem teimoso e resistente à voz de Deus, e esta resistência o levou à decadência moral e espiritual.

“OS SINAIS DE REBELDIA CONTRA O SENHOR DENUNCIAM A NOSSA DECADÊNCIA MORAL E ESPIRITUAL”

· S. I. Com base no texto, que sinais de rebeldia contra o Senhor denunciam a nossa decadência moral e espiritual?

· S. T. Com base no texto, veremos quatro sinais de rebeldia contra o Senhor que denunciam a nossa decadência moral e espiritual.

Se estes sinais estiverem presentes em nosso viver, ficará patente a nossa decadência moral e espiritual. Lembrando que a decadência moral e espiritual não acontece de repente. Vamos checar nossas vidas à luz da Palavra de Deus, e notar se estes sinais também nos denunciam. Não há nada mais importante do que nos submetermos humildemente ao Senhor, para que os sinais de rebeldia não façam parte do nosso viver e nos levem a decadência moral/espiritual.


1) A ênfase na promoção da imagem pessoal (vs. 12, 24, 30)

“Já chegou Saul ao Carmelo, e eis que levantou para si um monumento”

“porque temi o povo e dei ouvidos à sua voz.”

“honra-me, porém, agora, diante dos anciãos do meu povo e diante de Israel”

É interessante notar o quanto Saul estava buscando ressaltar a sua imagem pessoal perante o povo. Ele queria ser admirado, lembrado e ovacionado pela multidão como um rei diferenciado, um rei acima da média.Ele queria que a sua imagem como rei ficasse em evidência, por isso fez tudo o que foi possível para não “sair mal na fita”. Saul poupou Agague, o rei dos amalequitas, para exibi-lo como troféu de guerra, uma forma de exibição da sua proeza e poder. Ao construir um monumento após o triunfo na guerra, Saul queria deixar um memorial para que fosse lembrado pela vitória contra os amalequitas (outros líderes ergueram altares, Saul ergueu um monumento). Poupar o melhor das ovelhas e bois certamente traria mais popularidade a Saul diante da massa, pois o povo não teria que ofertar dos seus próprios rebanhos. Depois de uma aparente confissão de pecado, muita rasa e descuidada, Saul ainda queria que Samuel o honrasse diante dos anciãos, para que ninguém suspeitasse que algum problema tivesse acontecido. Saul era um verdadeiro amante de sua imagem, um verdadeiro narcisista na concepção da palavra.

“O que tem a noiva é o noivo; o amigo do noivo que está presente e o ouve muito se regozija por causa da voz do noivo. Pois esta alegria já se cumpriu em mim. Convém que ele cresça e que eu diminua” (João 3:29-30). Estas palavras foram ditas por João, o batista, um servo de Deus que entendia limpidamente qual o seu verdadeiro lugar. Ele não buscava popularidade e nem queria uma multidão o aplaudindo por onde passasse, pois não estava trabalhando em causa própria. Ele estava interessado somente em cumprir o seu papel dentro do plano de Deus: ser um precursor do Messias, e apontar para o Cordeiro de Deus.

Não é ruim quando a nossa imagem não é prestigiada porque seguimos a verdade bíblica e por termos posturas alinhadas com o que Deus requer de nós. Pelo contrário, isso é louvável. Mas quando valorizamos tanto a nossa imagem, a ponto de sermos desobedientes a Deus para preservá-la diante das pessoas, entramos numa espiral descendente. O amor pela impressão que as pessoas tem de nós e o amor pela popularidade tem sufocado muitos cristãos. Vance Havner disse que “a popularidade tem matado mais profetas do que a perseguição”.

Hoje muito esforço é feito para a promoção da imagem pessoal. Como diz uma propaganda: Imagem é tudo! Mas será que estamos cientes do perigo? Por conta de nossa natureza caída é muito fácil sermos iludidos pelo desejo de popularidade e de aceitação. À custa de princípios e valores espirituais muitos correm freneticamente em busca de aprovação. Você e eu tememos mais a desaprovação das pessoas, do que tememos a desaprovação de Deus? Precisamos dar testemunho da mudança que Cristo operou em nossos corações, independentemente do apoio de pessoas ao redor. Jesus mesmo advertiu os seus discípulos: “Ai de vós, quando todos vos louvarem! Porque assim procederam seus pais com os falsos profetas” (Lc. 6:26). Quando o mundo ímpio nos louva é sinal de que somos uma fraude! Neste mundo torto em que vivemos, as pessoas aprovam o que Deus desaprova e desaprovam o que Deus aprova. Portanto, muito cuidado com as concessões feitas em prol da aprovação e popularidade! Elas são sinais da nossa decadência moral e espiritual, e denunciam a nossa obstinação contra o Senhor.

2) A ênfase na motivação com aparência de piedade (vs. 15, 21)

“para os sacrificar ao Senhor, teu Deus”

“o melhor do designado à destruição para oferecer ao Senhor, teu Deus”

Justificar nossas atitudes com uma motivação “piedosa” é mais uma prova de nossa obstinação contra o Senhor. Saul apresenta a Samuel o motivo de ter poupado o melhor das ovelhas e bois. Ele enfatiza que o propósito era muito nobre: animais da melhor qualidade seriam oferecidos como holocausto ao Senhor. Esta motivação com aparência piedosa mostra que Saul era um homem cheio de estratégias para aliviar a sua barra. A ordem de Deus foi clara: tudo deveria ser destruído, pois os amalequitas tinha se tornado abominação ao Senhor; porém o rei Saul tinha planos para o seu próprio benefício: as reais intenções estavam associadas com a sua imagem e a sua própria glória. Para Saul, não custava nada pintar com um verniz de piedade a sua motivação egoísta. Há um contraste no texto: segundo o raciocínio de Saul o ritual de sacrifícios compensava a sua desobediência. Mas para o profeta Samuel, a obediência a Deus é sempre a forma mais sublime de sacrifício. Para um servo fiel, definitivamente, os fins não justificam os meios.

O relato sobre Ananias e Safira ilustra bem as motivações equivocadas com um verniz de piedade para tentar impressionar a homens e a Deus. Venderam uma propriedade e retiveram uma parte do valor, mas tentaram demonstrar uma generosidade tal como fez Barnabé. Ananias e Safira queriam impressionar os apóstolos, queriam transmitir uma imagem de supergenerosos. As reais motivações eram torpes, mas eles fizeram o possível para aparentar uma espiritualidade acima da média. Por conta disto, o fim deles foi trágico (At. 5: 1-11).

Muitos de nós pensamos que a vida cristã pode ser vivida com base em aparência de piedade. É um engano fatal. É como tapar o sol com a peneira: não traz nada de efetivo. O Senhor conhece o recôndito do nosso coração, e sabe na íntegra o que se passa em nossas mentes. Ele nos enxerga como “ovelhas sem couro”, tudo está claro e patente aos olhos d’Ele a Quem havemos de prestar contas. É verdade que Deus pesa as nossas ações, mas Ele também avalia profundamente as motivações com as quais agimos. A. W. Tozer escreveu: “Atos praticados por motivações vis são duplamente maus - maus em si mesmos e maus porque praticados em nome de Deus.”

Muitos conflitos são iniciados com base em motivações aparentemente piedosas. Há muita carnalidade revestida de piedade, inclusive dentro da igreja. Por exemplo, um irmão que se mostra disposto a cooperar com algum ministério motivado pelo “amor a Cristo” e pela “glória de Deus”, mas que não abre mão de suas preferências egoístas.

A piedade que demonstramos com os atos precisa ser um reflexo cristalino de motivações santificadas pela Palavra de Deus. Precisamos transmitir com clareza que a nossa fé não é uma fraude. Revestir nossas motivações egoístas com um verniz de piedade não contribui em nada para a aceitação destas motivações por parte do Senhor. Mesmo que a motivação seja piedosa, nossas atitudes de desobediência não passam despercebidas por Deus. As nossas boas intenções desonram a Deus quando não estão alicerçadas nas Escrituras. As boas intenções só podem ser consideradas boas se estão afinadas com os parâmetros do Senhor e em harmonia com os Seus mandamentos. Nenhum proveito há numa vida baseada em aparente piedade. Que possamos desistir de qualquer estratégia que objetiva enfatizar motivações com um verniz de piedade. Isto só realça a nossa obstinação contra o Senhor e um coração cheio de pecado.

3) A ênfase na negação de quaisquer pendências (vs. 13, 20)

“Bendito sejas tu do Senhor; executei as palavras do Senhor”

...pelo contrário, dei ouvidos à voz do Senhor e segui o caminho pelo qual o Senhor me enviou.”

No encontro com Samuel após a batalha contra os amalequitas, o rei Saul se dirige ao profeta com uma linguajar polido de calorosas boas-vindas. Saul apresenta o seu relatório: segundo a sua perspectiva ele havia executado cabalmente a missão que lhe foi confiada. Ele fala como se estivesse no automático, não querendo enxergar a realidade a sua volta. Mas o balido das ovelhas e o mugido dos bois denunciavam que esta versão dos fatos não era verídica. Contra fatos não há argumentos. Mesmo após o profeta declarar claramente “tu não atentaste à voz do Senhor”, o rei Saul rebate de modo categórico: Pelo contrário. É como se dissesse: “não é bem assim, eu fiz o que me foi solicitado, destruí os amalequitas”. Além disso, por duas vezes no texto Saul busca transferir a responsabilidade para os outros: “o povo tomou do despojo ovelhas e bois” (vs. 15 e 21). Em outras palavra: “eu não tenho nada a ver com isso”.

Certa feita perguntou-se a um cristão já idoso, que tinha passado por enormes dificuldades em sua vida, muitas delas como resultado direto de erros cometidos: “Que conselho o senhor daria a um jovem cristão que está começando a perceber as atrações deste mundo?” Aquele senhor de idade avançada refletiu um pouco e falou: “Eu diria: Meu filho, não importa a sua idade, não importa a sua inteligência, e nem o seu currículo. O que mais importa é que você não demore para aprender na Bíblia o que desonra a Deus, e quando errar não se faça de desentendido. Prosseguir adiante como se nada tivesse acontecido é agir como um tolo.”

A resistência em reconhecer prontamente o erro é um sinal muito forte de obstinação contra o Senhor, e nos leva a cometer muitos outros. Na Bíblia a expressão “dura cerviz” é uma ilustração para a rebeldia. Está relacionada com não reconhecer o erro, não dar ouvidos à instrução e não crer com inteireza no Senhor. Homens e mulheres de dura cerviz, quando confrontados mediante a Palavra de Deus, resistem em admitir que estão errados (Pv. 29:1). Preferem criar uma falsa sensação de segurança, sem dar real importância ao que precisa ser tratado.

Nunca, absolutamente nunca, é saudável fugir da realidade! Negar que existam pendências e criar um sistema ilusório de que tudo está bem é um caminho de decadência e fracasso certo. Quanto mais crescemos em santificação, maior a nossa percepção do pecado que tenazmente nos assedia seja em nossas atitudes, motivações ou pensamentos. Uma das evidências de que estamos crescendo em pureza é maior atenção ao que estorva a nossa caminhada com Cristo.

“Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós. Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós” (1 Jo. 1: 8 e 10). Precisamos ser honestos e transparentes, assumindo a responsabilidade pelos pecados para que possamos lidar sabiamente com eles. O sábio Salomão escreveu o provérbio: “O que encobre as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia” (Pv. 28:13). O sentido primário da palavra neste contexto é esconder, ocultar, apagar, criar mecanismos para negar a existência. Não há avanço ou crescimento na vida cristã enquanto o pecado não é reconhecido.

Não há paz para os rebeldes! Não há paz para quem ignora o pecado em seu próprio viver e não admite imediatamente as pendências que existem no seu relacionamento com o Senhor. Deus requer que os Seus filhos não transijam com o erro, e quando errar que seja transparente.

4) A ênfase na atenuação displicente da culpa (vs. 25, 30)

“volta comigo, para que adore o Senhor”; “e volta comigo, para que adore o Senhor, teu Deus.”

Samuel surpreende o rei Saul com um veredito: “O Senhor te rejeitou para que não sejas rei” (vs. 23). Somente depois deste veredito é que Saul esboça uma caricatura de arrependimento. Mas o fruto do verdadeiro arrependimento é a pronta obediência. Como passo inicial, Saul deveria concluir a missão aniquilando os rebanhos dos amalequitas e matando o rei Agague. Mas ele nem comenta sobre isso. Ele se mostra disposto a adorar ao Senhor, como uma forma de aliviar sua consciência culpada, pelo veredito que acabou de ouvir. Este foi um ato de adoração “para cumprir tabela”, feito pela pressão da culpa, oferecido de forma displicente/descuidada/negligente (faz-de-conta). A adoração, para Saul, não era um meio de relacionar-se com Deus e alegrar-se nEle. Era um meio egoísta de procurar alívio rápido para a sua consciência. Ele desejava “limpar a sua barra” diante de Deus, atenuando o peso que lhe sobreveio por ter sido desqualificado como rei. Mas com Deus não existem negociatas/barganhas. O Senhor não aceita compensações. Se homem não se dobrar, a adoração que presta a Deus é sem valor.

Uma pesquisa recente indicou que 89% dos brasileiros tomam algum tipo de analgésico, quando sentem dor de cabeça de qualquer intensidade. Segundo especialistas em cefaleia, o uso indiscriminado de analgésicos comuns pode piorar as crises. Parece paradoxal, mas um remédio que deveria aliviar o sintoma, pode agravá-lo. O alívio causado por tais medicamentos, quando usados indiscriminadamente, cobra seu preço levando a um aumento na frequência de crises. O tratamento correto de dores de cabeça frequentes exige um diagnóstico preciso do tipo de dor, para que sejam adotadas medidas preventivas, e não somente paliativas.

A consciência é serva de Deus para nos orientar ao caminho correto, nos levando a discernir o certo e o errado. Ela funciona como um sistema preventivo de alerta. Mas a consciência pode ficar cauterizada pelo uso de artifícios para atenuar o sentimento de culpa por pecados cometidos, principalmente quando as consequências trazem grande incômodo para o nosso ego. Não apenas a prática rotineira do pecado entorpece a consciência, mas também o modo errado que escolhemos para tratar o nosso coração quando pecamos. Certamente, não tratar o que precisa ser tratado à maneira de Deus, só vai piorar a nossa situação.

Sem contrição verdadeira e coração quebrantado do adorador, nenhum ato de adoração é válido e aceitável aos olhos do Senhor (Salmo 51:17). Tiago nos ensina a não sermos superficiais neste processo de restauração: “Purificai as mãos, pecadores; e vós que sois de ânimo dobre, limpai o coração. Afligi-vos, lamentai e chorai. Converta-se o vosso riso em pranto, e a vossa alegria, em tristeza. Humilhai-vos na presença do Senhor, e ele vos exaltará” (Tg. 4:8-10). O nosso coração precisa e deve ser tranquilizado pelos meios de graça corretos, quando reconhecemos a feiúra do nosso pecado. Isto não nos isenta da reparação necessária (Saul não se mostrou pronto a aniquilar o rei Agague e nem os rebanhos que foram poupados dos amalequitas).

Vir à igreja, reunir-se com o povo de Deus, entoar louvores a Cristo, meditar e estudar a santa Palavra, orar e manter comunhão com Deus (mediada por Cristo), o compromisso com algum ministério, o exercício dos dons espirituais, são privilégios inegáveis e tudo isso deve se constituir o nosso maior prazer. Mas quando fazemos isso com o objetivo de trazer um paliativo à nossa consciência culpada, sem confrontar seriamente o nosso coração pecaminoso, estamos apenas fazendo uso de “analgésicos”, que por fim vão trazer ainda maior endurecimento. Definitivamente, na relação com o Senhor não há espaço para medidas superficiais e paliativas.

 

Sermão Pregado em 03/08/14 – Igreja Batista Regular Jardim Amazonas