terça-feira, 12 de agosto de 2014

DECADÊNCIA MORAL E ESPIRITUAL

Texto: 1 Sm. 15: 1-31

I. Quando penso em decadência, a ideia que logo vem a minha mente é uma casa ou um prédio em ruínas. Recentemente, vi algumas fotos da casa que meus avós moravam no interior de Araripina. As fotos mostram as ruínas de uma casa grande que abrigou pessoas que hoje lá não vivem mais. Algumas paredes caídas, a ausência do telhado em vários cômodos, blocos espalhados pelo chão, compõem o cenário de um tempo que passou. A decadência de uma casa em ruínas também demonstra que não houve manutenção regular ou uma boa reforma. Ao longo dos anos, o efeito das chuvas, dos ventos e do sol forte contribui diretamente para deteriorar uma casa, e se não houver manutenção, em breve restarão somente ruínas. Porém, muito pior do que uma casa em ruínas, é a decadência da alma, é quando a nossa fé está em ruínas. Quando a alma está deteriorada pelo pecado não-confessado e não-abandonado, ela precisa de uma restauração urgente. A fé em decadência é um testemunho da nossa negligência e apatia para com os valores espirituais.

II. E por falar em decadência, o texto lido nos apresenta mais um episódio trágico na vida do obstinado rei Saul. As atitudes de Saul vão da negligência à rebeldia e comprovam um homem decadente, uma vida que desmorona cada vez mais, tanto do ponto de vista moral quanto espiritual. A história deste homem, escolhido para ser o primeiro rei de Israel, é repleta de contradições que minaram o seu reinado, marcado por inveja, orgulho e declínio.

Ao rei Saul coube a missão de exterminar os amalequitas, uma antiga tribo nômade descendente de Esaú (Gn. 36:12). Os amalequitas não eram um povo inocente. Este povo criou empecilhos para o povo de Israel. Quando os israelitas partiram do Egito rumo à terra prometida, eles foram atacados pelos amalequitas, conforme Dt. 25: 17-19. Foi um ataque covarde, feito pelas costas, aos abatidos e fatigados do povo de Israel. Então havia um justo juízo estabelecido por Deus para os amalequitas. Esta ordem não se tratava de um capricho de um Deus carrasco, mas do exercício da plena justiça do Senhor em prol da vindicação da Sua santidade e Sua glória.

Mas a missão confiada ao rei Saul não foi cumprida na íntegra. As palavras que Saul utiliza para responder a Samuel no texto lido testificam contra ele mesmo e comprovam a obstinação presente em seu coração. Saul era um homem teimoso e resistente à voz de Deus, e esta resistência o levou à decadência moral e espiritual.

“OS SINAIS DE REBELDIA CONTRA O SENHOR DENUNCIAM A NOSSA DECADÊNCIA MORAL E ESPIRITUAL”

· S. I. Com base no texto, que sinais de rebeldia contra o Senhor denunciam a nossa decadência moral e espiritual?

· S. T. Com base no texto, veremos quatro sinais de rebeldia contra o Senhor que denunciam a nossa decadência moral e espiritual.

Se estes sinais estiverem presentes em nosso viver, ficará patente a nossa decadência moral e espiritual. Lembrando que a decadência moral e espiritual não acontece de repente. Vamos checar nossas vidas à luz da Palavra de Deus, e notar se estes sinais também nos denunciam. Não há nada mais importante do que nos submetermos humildemente ao Senhor, para que os sinais de rebeldia não façam parte do nosso viver e nos levem a decadência moral/espiritual.


1) A ênfase na promoção da imagem pessoal (vs. 12, 24, 30)

“Já chegou Saul ao Carmelo, e eis que levantou para si um monumento”

“porque temi o povo e dei ouvidos à sua voz.”

“honra-me, porém, agora, diante dos anciãos do meu povo e diante de Israel”

É interessante notar o quanto Saul estava buscando ressaltar a sua imagem pessoal perante o povo. Ele queria ser admirado, lembrado e ovacionado pela multidão como um rei diferenciado, um rei acima da média.Ele queria que a sua imagem como rei ficasse em evidência, por isso fez tudo o que foi possível para não “sair mal na fita”. Saul poupou Agague, o rei dos amalequitas, para exibi-lo como troféu de guerra, uma forma de exibição da sua proeza e poder. Ao construir um monumento após o triunfo na guerra, Saul queria deixar um memorial para que fosse lembrado pela vitória contra os amalequitas (outros líderes ergueram altares, Saul ergueu um monumento). Poupar o melhor das ovelhas e bois certamente traria mais popularidade a Saul diante da massa, pois o povo não teria que ofertar dos seus próprios rebanhos. Depois de uma aparente confissão de pecado, muita rasa e descuidada, Saul ainda queria que Samuel o honrasse diante dos anciãos, para que ninguém suspeitasse que algum problema tivesse acontecido. Saul era um verdadeiro amante de sua imagem, um verdadeiro narcisista na concepção da palavra.

“O que tem a noiva é o noivo; o amigo do noivo que está presente e o ouve muito se regozija por causa da voz do noivo. Pois esta alegria já se cumpriu em mim. Convém que ele cresça e que eu diminua” (João 3:29-30). Estas palavras foram ditas por João, o batista, um servo de Deus que entendia limpidamente qual o seu verdadeiro lugar. Ele não buscava popularidade e nem queria uma multidão o aplaudindo por onde passasse, pois não estava trabalhando em causa própria. Ele estava interessado somente em cumprir o seu papel dentro do plano de Deus: ser um precursor do Messias, e apontar para o Cordeiro de Deus.

Não é ruim quando a nossa imagem não é prestigiada porque seguimos a verdade bíblica e por termos posturas alinhadas com o que Deus requer de nós. Pelo contrário, isso é louvável. Mas quando valorizamos tanto a nossa imagem, a ponto de sermos desobedientes a Deus para preservá-la diante das pessoas, entramos numa espiral descendente. O amor pela impressão que as pessoas tem de nós e o amor pela popularidade tem sufocado muitos cristãos. Vance Havner disse que “a popularidade tem matado mais profetas do que a perseguição”.

Hoje muito esforço é feito para a promoção da imagem pessoal. Como diz uma propaganda: Imagem é tudo! Mas será que estamos cientes do perigo? Por conta de nossa natureza caída é muito fácil sermos iludidos pelo desejo de popularidade e de aceitação. À custa de princípios e valores espirituais muitos correm freneticamente em busca de aprovação. Você e eu tememos mais a desaprovação das pessoas, do que tememos a desaprovação de Deus? Precisamos dar testemunho da mudança que Cristo operou em nossos corações, independentemente do apoio de pessoas ao redor. Jesus mesmo advertiu os seus discípulos: “Ai de vós, quando todos vos louvarem! Porque assim procederam seus pais com os falsos profetas” (Lc. 6:26). Quando o mundo ímpio nos louva é sinal de que somos uma fraude! Neste mundo torto em que vivemos, as pessoas aprovam o que Deus desaprova e desaprovam o que Deus aprova. Portanto, muito cuidado com as concessões feitas em prol da aprovação e popularidade! Elas são sinais da nossa decadência moral e espiritual, e denunciam a nossa obstinação contra o Senhor.

2) A ênfase na motivação com aparência de piedade (vs. 15, 21)

“para os sacrificar ao Senhor, teu Deus”

“o melhor do designado à destruição para oferecer ao Senhor, teu Deus”

Justificar nossas atitudes com uma motivação “piedosa” é mais uma prova de nossa obstinação contra o Senhor. Saul apresenta a Samuel o motivo de ter poupado o melhor das ovelhas e bois. Ele enfatiza que o propósito era muito nobre: animais da melhor qualidade seriam oferecidos como holocausto ao Senhor. Esta motivação com aparência piedosa mostra que Saul era um homem cheio de estratégias para aliviar a sua barra. A ordem de Deus foi clara: tudo deveria ser destruído, pois os amalequitas tinha se tornado abominação ao Senhor; porém o rei Saul tinha planos para o seu próprio benefício: as reais intenções estavam associadas com a sua imagem e a sua própria glória. Para Saul, não custava nada pintar com um verniz de piedade a sua motivação egoísta. Há um contraste no texto: segundo o raciocínio de Saul o ritual de sacrifícios compensava a sua desobediência. Mas para o profeta Samuel, a obediência a Deus é sempre a forma mais sublime de sacrifício. Para um servo fiel, definitivamente, os fins não justificam os meios.

O relato sobre Ananias e Safira ilustra bem as motivações equivocadas com um verniz de piedade para tentar impressionar a homens e a Deus. Venderam uma propriedade e retiveram uma parte do valor, mas tentaram demonstrar uma generosidade tal como fez Barnabé. Ananias e Safira queriam impressionar os apóstolos, queriam transmitir uma imagem de supergenerosos. As reais motivações eram torpes, mas eles fizeram o possível para aparentar uma espiritualidade acima da média. Por conta disto, o fim deles foi trágico (At. 5: 1-11).

Muitos de nós pensamos que a vida cristã pode ser vivida com base em aparência de piedade. É um engano fatal. É como tapar o sol com a peneira: não traz nada de efetivo. O Senhor conhece o recôndito do nosso coração, e sabe na íntegra o que se passa em nossas mentes. Ele nos enxerga como “ovelhas sem couro”, tudo está claro e patente aos olhos d’Ele a Quem havemos de prestar contas. É verdade que Deus pesa as nossas ações, mas Ele também avalia profundamente as motivações com as quais agimos. A. W. Tozer escreveu: “Atos praticados por motivações vis são duplamente maus - maus em si mesmos e maus porque praticados em nome de Deus.”

Muitos conflitos são iniciados com base em motivações aparentemente piedosas. Há muita carnalidade revestida de piedade, inclusive dentro da igreja. Por exemplo, um irmão que se mostra disposto a cooperar com algum ministério motivado pelo “amor a Cristo” e pela “glória de Deus”, mas que não abre mão de suas preferências egoístas.

A piedade que demonstramos com os atos precisa ser um reflexo cristalino de motivações santificadas pela Palavra de Deus. Precisamos transmitir com clareza que a nossa fé não é uma fraude. Revestir nossas motivações egoístas com um verniz de piedade não contribui em nada para a aceitação destas motivações por parte do Senhor. Mesmo que a motivação seja piedosa, nossas atitudes de desobediência não passam despercebidas por Deus. As nossas boas intenções desonram a Deus quando não estão alicerçadas nas Escrituras. As boas intenções só podem ser consideradas boas se estão afinadas com os parâmetros do Senhor e em harmonia com os Seus mandamentos. Nenhum proveito há numa vida baseada em aparente piedade. Que possamos desistir de qualquer estratégia que objetiva enfatizar motivações com um verniz de piedade. Isto só realça a nossa obstinação contra o Senhor e um coração cheio de pecado.

3) A ênfase na negação de quaisquer pendências (vs. 13, 20)

“Bendito sejas tu do Senhor; executei as palavras do Senhor”

...pelo contrário, dei ouvidos à voz do Senhor e segui o caminho pelo qual o Senhor me enviou.”

No encontro com Samuel após a batalha contra os amalequitas, o rei Saul se dirige ao profeta com uma linguajar polido de calorosas boas-vindas. Saul apresenta o seu relatório: segundo a sua perspectiva ele havia executado cabalmente a missão que lhe foi confiada. Ele fala como se estivesse no automático, não querendo enxergar a realidade a sua volta. Mas o balido das ovelhas e o mugido dos bois denunciavam que esta versão dos fatos não era verídica. Contra fatos não há argumentos. Mesmo após o profeta declarar claramente “tu não atentaste à voz do Senhor”, o rei Saul rebate de modo categórico: Pelo contrário. É como se dissesse: “não é bem assim, eu fiz o que me foi solicitado, destruí os amalequitas”. Além disso, por duas vezes no texto Saul busca transferir a responsabilidade para os outros: “o povo tomou do despojo ovelhas e bois” (vs. 15 e 21). Em outras palavra: “eu não tenho nada a ver com isso”.

Certa feita perguntou-se a um cristão já idoso, que tinha passado por enormes dificuldades em sua vida, muitas delas como resultado direto de erros cometidos: “Que conselho o senhor daria a um jovem cristão que está começando a perceber as atrações deste mundo?” Aquele senhor de idade avançada refletiu um pouco e falou: “Eu diria: Meu filho, não importa a sua idade, não importa a sua inteligência, e nem o seu currículo. O que mais importa é que você não demore para aprender na Bíblia o que desonra a Deus, e quando errar não se faça de desentendido. Prosseguir adiante como se nada tivesse acontecido é agir como um tolo.”

A resistência em reconhecer prontamente o erro é um sinal muito forte de obstinação contra o Senhor, e nos leva a cometer muitos outros. Na Bíblia a expressão “dura cerviz” é uma ilustração para a rebeldia. Está relacionada com não reconhecer o erro, não dar ouvidos à instrução e não crer com inteireza no Senhor. Homens e mulheres de dura cerviz, quando confrontados mediante a Palavra de Deus, resistem em admitir que estão errados (Pv. 29:1). Preferem criar uma falsa sensação de segurança, sem dar real importância ao que precisa ser tratado.

Nunca, absolutamente nunca, é saudável fugir da realidade! Negar que existam pendências e criar um sistema ilusório de que tudo está bem é um caminho de decadência e fracasso certo. Quanto mais crescemos em santificação, maior a nossa percepção do pecado que tenazmente nos assedia seja em nossas atitudes, motivações ou pensamentos. Uma das evidências de que estamos crescendo em pureza é maior atenção ao que estorva a nossa caminhada com Cristo.

“Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós. Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós” (1 Jo. 1: 8 e 10). Precisamos ser honestos e transparentes, assumindo a responsabilidade pelos pecados para que possamos lidar sabiamente com eles. O sábio Salomão escreveu o provérbio: “O que encobre as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia” (Pv. 28:13). O sentido primário da palavra neste contexto é esconder, ocultar, apagar, criar mecanismos para negar a existência. Não há avanço ou crescimento na vida cristã enquanto o pecado não é reconhecido.

Não há paz para os rebeldes! Não há paz para quem ignora o pecado em seu próprio viver e não admite imediatamente as pendências que existem no seu relacionamento com o Senhor. Deus requer que os Seus filhos não transijam com o erro, e quando errar que seja transparente.

4) A ênfase na atenuação displicente da culpa (vs. 25, 30)

“volta comigo, para que adore o Senhor”; “e volta comigo, para que adore o Senhor, teu Deus.”

Samuel surpreende o rei Saul com um veredito: “O Senhor te rejeitou para que não sejas rei” (vs. 23). Somente depois deste veredito é que Saul esboça uma caricatura de arrependimento. Mas o fruto do verdadeiro arrependimento é a pronta obediência. Como passo inicial, Saul deveria concluir a missão aniquilando os rebanhos dos amalequitas e matando o rei Agague. Mas ele nem comenta sobre isso. Ele se mostra disposto a adorar ao Senhor, como uma forma de aliviar sua consciência culpada, pelo veredito que acabou de ouvir. Este foi um ato de adoração “para cumprir tabela”, feito pela pressão da culpa, oferecido de forma displicente/descuidada/negligente (faz-de-conta). A adoração, para Saul, não era um meio de relacionar-se com Deus e alegrar-se nEle. Era um meio egoísta de procurar alívio rápido para a sua consciência. Ele desejava “limpar a sua barra” diante de Deus, atenuando o peso que lhe sobreveio por ter sido desqualificado como rei. Mas com Deus não existem negociatas/barganhas. O Senhor não aceita compensações. Se homem não se dobrar, a adoração que presta a Deus é sem valor.

Uma pesquisa recente indicou que 89% dos brasileiros tomam algum tipo de analgésico, quando sentem dor de cabeça de qualquer intensidade. Segundo especialistas em cefaleia, o uso indiscriminado de analgésicos comuns pode piorar as crises. Parece paradoxal, mas um remédio que deveria aliviar o sintoma, pode agravá-lo. O alívio causado por tais medicamentos, quando usados indiscriminadamente, cobra seu preço levando a um aumento na frequência de crises. O tratamento correto de dores de cabeça frequentes exige um diagnóstico preciso do tipo de dor, para que sejam adotadas medidas preventivas, e não somente paliativas.

A consciência é serva de Deus para nos orientar ao caminho correto, nos levando a discernir o certo e o errado. Ela funciona como um sistema preventivo de alerta. Mas a consciência pode ficar cauterizada pelo uso de artifícios para atenuar o sentimento de culpa por pecados cometidos, principalmente quando as consequências trazem grande incômodo para o nosso ego. Não apenas a prática rotineira do pecado entorpece a consciência, mas também o modo errado que escolhemos para tratar o nosso coração quando pecamos. Certamente, não tratar o que precisa ser tratado à maneira de Deus, só vai piorar a nossa situação.

Sem contrição verdadeira e coração quebrantado do adorador, nenhum ato de adoração é válido e aceitável aos olhos do Senhor (Salmo 51:17). Tiago nos ensina a não sermos superficiais neste processo de restauração: “Purificai as mãos, pecadores; e vós que sois de ânimo dobre, limpai o coração. Afligi-vos, lamentai e chorai. Converta-se o vosso riso em pranto, e a vossa alegria, em tristeza. Humilhai-vos na presença do Senhor, e ele vos exaltará” (Tg. 4:8-10). O nosso coração precisa e deve ser tranquilizado pelos meios de graça corretos, quando reconhecemos a feiúra do nosso pecado. Isto não nos isenta da reparação necessária (Saul não se mostrou pronto a aniquilar o rei Agague e nem os rebanhos que foram poupados dos amalequitas).

Vir à igreja, reunir-se com o povo de Deus, entoar louvores a Cristo, meditar e estudar a santa Palavra, orar e manter comunhão com Deus (mediada por Cristo), o compromisso com algum ministério, o exercício dos dons espirituais, são privilégios inegáveis e tudo isso deve se constituir o nosso maior prazer. Mas quando fazemos isso com o objetivo de trazer um paliativo à nossa consciência culpada, sem confrontar seriamente o nosso coração pecaminoso, estamos apenas fazendo uso de “analgésicos”, que por fim vão trazer ainda maior endurecimento. Definitivamente, na relação com o Senhor não há espaço para medidas superficiais e paliativas.

 

Sermão Pregado em 03/08/14 – Igreja Batista Regular Jardim Amazonas

Nenhum comentário: