sexta-feira, 18 de junho de 2010

Um coração em caos

Leitura Bíblica: I Samuel 25


No mês de abril deste ano a erupção de um vulcão na Islândia (não me arrisco a citar o nome do vulcão) provocou um enorme caos aéreo na Europa e, consequentemente, no mundo. Este caos aéreo foi considerado o mais grave desde a interrupção dos voos no 11 de setembro, e está custando mais de US$ 200 milhões ao dia às companhias aéreas. Só no dia 17 de abril, 17.000 voos foram cancelados. Milhares de pessoas perderam seus compromissos em outros países, muitas cargas não chegaram ao seu destino e enormes prejuízos foram acumulados nos sete dias em que o vulcão não permitiu viagens de avião. Realmente, foi uma situação extremamente caótica.

A palavra caos transmite a ideia de desordem generalizada, uma bagunça ou confusão de grandes proporções. Neste texto que acabamos de ler, observamos Davi irado contra Nabal. Davi convocou 400 homens para cometer uma chacina, porque Nabal tinha se comportado de maneira arrogante e prepotente. O caos neste contexto não está somente na situação que se desenhava, mas encontra-se principalmente dentro do coração de Davi. A situação caótica do coração de Davi o levaram a ter esta explosão de ira. A Bíblia nos mostra que do coração procedem todas as coisas más – e por isso todo problema deve ser entendido no nível do coração para ser devidamente tratado com os princípios bíblicos. Se ficarmos apenas na superfície do problema sem buscar resolvê-lo na origem, em algum momento ele ressurgirá com mais força. A ira demonstrada por palavras e ações realmente nasce no coração.

PROPOSIÇÃO: "As manifestações de ira refletem a situação caótica do nosso coração"

Podemos afirmar que as explosões de ira refletem a situação caótica do coração percebendo alguns INDÍCIOS neste texto. Quais indícios neste texto nos mostram a situação caótica do coração de Davi?

1) As manifestações de ira refletem um coração auto-centralizado (vs. 5, 10)

Davi já estava bastante conhecido em toda a região. Ele já tinha vencido algumas batalhas contra povos inimigos, por isso sua fama se espalhara em todo o Israel. Quando ele enviou os dez homens para falar com Nabal, Davi fez questão que o seu nome fosse referido. Desta forma, ele quis mostrar a Nabal que não era “qualquer um”, ele era o guerreiro “mais famoso do momento.” O problema é que o nome de Davi não causou nenhuma reverência da parte de Nabal, pelo contrário, foi motivo de piada (Davi era mais um bandoleiro, na opinião de Nabal). Isso não agradou de forma nenhuma a Davi porque ele estava com o foco muito voltado para si mesmo – seu interesse era despertar honra e respeito por seu nome.
Certa vez, perguntaram a um filósofo cristão: Qual o maior problema do mundo? Ele respondeu prontamente: “Eu”! Esta resposta mostra que enquanto não crucificarmos o velho homem corrompido, ele continuará mostrando sua face – sempre buscando maior glória.
Paulo foi duramente ofendido pela igreja de Corinto. Muitos naquela igreja o consideravam um homem fraco – um pregador sem qualidade e cheio de defeitos. Ele estava sendo criticado de várias maneiras então ele escreveu a segunda carta para defender o seu ministério apostólico. Note este versículo: “Porque não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus como Senhor e a nós mesmos como vossos servos, por amor de Jesus” (II Co. 4:5). Seu coração não estava centralizado em si mesmo – ele sabia perfeitamente que o seu ministério era uma dádiva do Senhor. Saber disto o confortava e o levou a dizer: “Aquele, porém, que se gloria, glorie-se no Senhor. Porque não é aprovado quem a si mesmo se louva, e sim aquele a quem o Senhor louva” (II Co. 10: 17-18). Paulo não usou de arrogância e nem derramou ira na sua defesa, porque ele não se considerava o “centro do universo”.
Se estivermos muito preocupados em garantir a nossa reputação, poderemos explodir em ira rapidamente quando esta reputação for de alguma forma maculada. Às vezes enfatizamos muito o cuidado com o markentig pessoal, promovendo nossos interesses acima dos interesses do Senhor. Esta ênfase exagerada no que os homens pensam a nosso respeito é pecado – estamos idolatrando nós mesmos. A nossa reputação precisa estar alinhada com os princípios bíblicos e ponto final. Nada que traga méritos para nós pode ser cultivado em nossos corações, porque isto vai nos levar a enfrentar problemas graves. O crente não deve se colocar no “centro das atenções” e esperar que todos em redor se prostrem diante dele. Nós não somos o fim em nós mesmos, precisamos viver para glorificar unicamente ao Senhor (I Co. 10:31).
Como você lida com as injúrias que afetam a sua reputação? Será que a primeira alternativa é sempre explodir em ódio e ira? Ou temos um coração que não busca glórias pessoais, a ponto de tratar biblicamente com as pessoas que não reconhecem o nosso valor? Não quero ser mal interpretado. A calúnia e a fofoca devem ser tratadas como a Bíblia nos mostra: são pecados que precisam ser abominados. É óbvio que geralmente não são tratadas com a devida seriedade. “Mais importante do que os outros pensam de nós, é o que os outros pensam de nós como representantes de Cristo.” Piper Será que a excelência de Cristo está sendo demonstrada em nossa vida? É isso que deve nos interessar, e não se nós mesmos estamos sendo aplaudidos.

2) As manifestações de ira refletem um coração amargurado (vs. 21)

“Ele me pagou mal por bem” – é a conclusão de Davi no verso 21. A amargura tomou conta do seu coração porque ele tinha sido benévolo para com Nabal oferecendo proteção aos pastores de rebanhos durante o tempo que estiveram no Carmelo (vs. 7). Os homens que Davi enviou a Nabal foram recebidos com arrogância: “Tomaria eu, pois, o meu pão, e a minha água, e a carne das minhas reses que degolei para os meus tosquiadores e o daria a homens que eu não sei donde vêm?” (vs. 11). Tudo isso machucou Davi, que se amargurou profundamente porque sua ajuda a Nabal não foi compensada de alguma forma. O fato é que a reação egoísta de Nabal provocou um turbilhão de amargura no coração de Davi.
Uma pessoa que tinha motivos de sobra para carregar um coração amargurado para o resto da vida era José. Ele foi vendido como escravo pelos próprios irmãos, acusado falsamente pela mulher de Potifar e esquecido na prisão. Os anos se passaram e ele ocupou uma posição de grande destaque no império egípcio. José teve a oportunidade de encontrar-se novamente com seus irmãos – com o poder nas mãos para derramar ira e ódio se estivesse carregando ainda a amargura no coração. No entanto, José reconheceu que o mal causado por seus irmãos foi convertido em bem nos planos de Deus. Esta perspectiva o livro de ter um coração amargurado – que na verdade é uma bomba-relógio que pode explodir a qualquer momento.
A amargura no coração pode nascer quando nossos melhores esforços em prol de alguém não são compensados. Geralmente, a amargura está relacionada com expectativas frustradas. Pessoas amargas carregam grandes fardos porque criaram enormes expectativas que não foram devidamente satisfeitas. “Quando um desejo não realizado me tenta a ficar amargurado, eu demonstro que estou confiando na realização daquele desejo para suprir minhas necessidades, ao invés de confiar em Deus” (C. J. Mahaney). É comum observar a amargura em casamentos quando o casal não consegue estabelecer expectativas realistas. Esta amargura pode ir se acumulando até chegar o ponto de estourar numa explosão de raiva e ódio dentro do lar. O ressentimento causado por dificuldades de relacionamento precisa ser jogado para longe, antes que cause graves estragos. Alguém disse que “a mágoa é a ira congelada.”
Como você tem reagido às raízes de amargura que querem brotar em seu coração? Com o auxílio do Espírito Santo, você tem arrancado as raízes que teimam em brotar? Não devemos permitir que estas raízes contaminem muitos ao nosso redor, como está escrito em Hebreus 12:15: “nem haja alguma raiz de amargura que, brotando, vos perturbe, e, por meio dela, muitos sejam contaminados.” Quem se alimenta da mágoa não tem paz. Não tem liberdade. Não tem alegria. Não conhece o amor. Não tem comunhão com Deus e não pode adorar a Deus em espírito e em verdade. Precisamos nos despojar de toda amargura e de suas filhas: “Longe de vós, toda amargura, e cólera, e ira, e gritaria, e blasfêmias, e bem assim toda malícia” (Ef. 4:31).

3) As manifestações de ira refletem um coração não-perdoador (vs. 13)

Davi estava determinado a cometer a matança. Ele iria acabar de vez com Nabal e todos os seus homens, sem dúvida seu plano inicial foi esse. Observe que Ele não parou em nenhum momento para refletir – sua visão estava totalmente embaçada pelo ódio. O verso 13 relata a resposta imediata de Davi aos seus companheiros, sem nenhuma séria avaliação do problema. Ele mandou que 400 homens cingissem suas espadas para colocar fim à insolência de Nabal. Davi em nenhum momento considerou o perdão como alternativa legítima nesta situação em que foi afrontado. Ele só desistiu do seu plano assassino ao encontrar-se com Abigail que o convenceu a desistir. Até o momento deste encontro, Davi estava resistente à ideia de perdoar a grave ofensa sofrida.
Na parábola do credor incompassivo, registrada em Mateus 18: 23-35, observamos que o homem que foi grandemente perdoado de sua dívida, mas que não perdoou uma dívida muito menor de outra pessoa, explodiu em ira e ódio. Diz o texto bíblico: “Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem denários; e, agarrando-o, o sufocava, dizendo: Paga-me o que me deves.” A palavra sufocar tem a ideia de estrangular com muita força e violentamente. Aquele homem explodiu em ira porque não tinha um coração perdoador, mesmo tendo sido perdoado há pouco tempo atrás.
O perdão é um imperativo divino – seja qual for a ofensa recebida. Como cristãos, devemos ter um coração perdoador, tendo em vista que nós também somos alvo do amor e do perdão maravilhoso de Deus. A Bíblia nos adverte que o perdão não deve ser opcional – ele deve ser tratado como o ingrediente fundamental nos relacionamentos. Sem perdão efetivo e bíblico não há possibilidade de existir relacionamentos saudáveis. Por isso tantas vezes somos advertidos sobre a importância de termos um coração perdoador. O perdão mostra que de fato entendemos a mensagem central do Evangelho, pois Deus, em Cristo, nos perdoou. A maneira como nos comportamos diante de alguém que nos causou algum mal, determina se de fato somos cristãos na essência da palavra. Se o rancor e o ódio já se tornaram prática comum na solução de conflitos, precisamos retornar aos princípios bíblicos urgentemente. Cristo não nos ensinou a revidar ou dar o troco na mesma moeda, quando somos ofendidos de alguma forma. Ele nos mostrou que é totalmente possível oferecer a outra face, andar mais uma milha, e perdoar muito mais do que 70 vezes 7. Jesus perdoou Judas naquela noite da última ceia com os discípulos, mesmo sabendo que seria entregue aos soldados romanos por meio de um beijo traiçoeiro.
Você tem explodido em ira por causa da falta de perdão? Você está arrastando fardos insuportáveis porque não consegue perdoar alguém que o feriu? Você tem algum Nabal em sua vida? Como você o tem tratado? Será que as explosões de ira estão superando a prática do perdão bíblico em seu cotidiano como cristão? Que possamos refletir seriamente sobre a necessidade de sempre cultivarmos um coração perdoador, mesmo que alguém nos pague o bem com o mal.

MARCOS AURÉLIO DE MELO
ESTUDOS NO LIVRO DE I SAMUEL

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